Polêmicas Olímpicas


 (Artigo- resposta à carta do Prefeito Eduardo Paes, publicado no jornal O Estado de São Paulo de 11/06/2016)

 

O Prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, reagiu com surpresa à minha coluna “Frustrações Olímpicas”, publicada nesse jornal na última quarta-feira, 8 de junho. Em carta para o jornal, disse o Prefeito que o artigo continha diversas informações equivocadas. Ele está correto em um ponto, em particular: as finanças do município do Rio de Janeiro estão bem, as que vão mal são as do estado. Tão mal que recentemente a agência Reuters noticiou que as autoridades competentes estariam analisando a possibilidade de solicitar empréstimos para atender às demandas olímpicas, dado o estado lastimável das contas públicas do antigo estado da Guanabara.

Finanças locais à parte, o propósito de meu artigo não era discorrer sobre sangrias que sabemos existir nas contas públicas de estados e municípios – à exceção da cidade maravilhosa e de punhado de outros municípios. O ponto do artigo era alertar para os custos de mega eventos esportivos, e os prejuízos que geralmente deixam em seu rastro, conforme ampla documentação empírica e acadêmica. É fato que, entre os jorgos de verão e os de inverno, a única cidade que teve algum lucro no setor hoteleiro e de alimentação ao sediá-los foi a Salt Lake City do ex-candidato à Presidência dos EUA pelo partido republicano, Mitt Romney. As evidências não deixam margem para dúvidas: os motivos que levam países e cidades a pleitear os jogos são tudo, menos econômicos. No referido artigo, calculei que o prejuízo possível de sediar as Olimpíadas poderia custar ao País cerca de 0,7% do PIB, ou R$ 42 bilhões de reais. O cálculo foi feito com base naquilo que revelam os estudos acadêmicos sobre os jogos olímpicos e outros grandes eventos esportivos. O Prefeito Eduardo Paes discorre sobre as obras que estão sendo feitas, e o legado que deixarão. Cita relatório da agência de risco Moody’s. Nada a discordar. Apenas, insisto: a vasta literatura existente, aquela que documenta minuciosamente o ocorrido em diversos países é categórica ao revelar os efeitos macroeconômicos inexistentes – por vezes, perversos – de sediar os jogos. Isso não significa que a cidade do Rio de Janeiro não será beneficiada por obras de legado, tampouco que não haverá melhorias em sua infraestrutura.

O Prefeito disponibilizou diversos dados em sua carta, o que é de grande valia. Afinal, não é nada fácil encontrar os referidos dados nos diversos sites oficiais dos jogos olímpicos. Contudo, reitero: a questão é saber qual haverá de ser o ônus para o País, não o polimento e o brilho de que o Rio de Janeiro desfrutará. Em um dos sites oficiais, há menção a estudo comissionado pelo Ministério do Esporte, preparado pela USP. Tal estudo diz que o impacto das Olimpíadas no PIB do País poderia alcançar cerca de 2% do PIB. Surpreendida fiquei quando encontrei apenas as citações de números do estudo, números que merecem escrutínio, sobretudo ante a gravíssima crise fiscal que atinge o País, a nossa própria “Grande Depressão”, como qualificou o Ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Pois o estudo não está disponível, não se tem acesso às suas hipóteses, à sua metodologia, ao que levou aos 2% do PIB de ganhos, ou à alegação de que seriam criados cerca de 120 mil empregos por ano até 2027 devido aos jogos olímpicos.

Em contrapartida, a literatura acadêmica sobre mega eventos esportivos mostra que: a Olimpíada de Munique não teve qualquer impacto econômico; os jogos de 1996 em Atlanta, tampouco; os jogos de Sydney, na Austrália, levaram a uma redução no consumo das famílias no ano das Olimpíadas equivalente a US$ 2 bilhões – apenas para citar alguns casos. É fundamental destacar que esses são exemplos de cidades situadas em países ricos, economias maduras. Não é por acaso que não há muitos jogos sediados em cidades de países menos desenvolvidos. Entre 1896 e 2020 terão sido apenas 4 cidades de países em desenvolvimento a sediar os jogos de verão, contra 24 de países industrializados.

Sou carioca, torço para que os jogos sejam um sucesso, ou ao menos para que deem trégua breve ao sofrimento nacional. Mas, o que não posso fazer é ignorar os fatos. Os fatos, essas inconvenientes doses de realidade, não dão alento sequer, por melhores que sejam os esforços da Prefeitura de minha cidade natal.