Desenho do regime fiscal brasileiro precisa ser repensado


O desenho do regime fiscal brasileiro precisa ser repensado e isso é um dos grandes desafios do tripé macroeconômico adotado no país, diz Arminio Fraga, fundador da Gávea Investimentos. Para ele, é preciso estabelecer prioridades e estabelecer um regime que dê previsibilidade e confiança para investimentos de longo prazo.

O ex-presidente do Banco Central também defendeu uma reforma administrativa “caprichada” como forma de tornar o gasto público mais eficiente. O tripé macroeconômico, que está com a perna do fiscal “bem capenga”, traz enorme desafio, diz o economista.

O teto de gastos, destaca, sinalizou que não é possível continuar a crescer com a relação gasto público/PIB, considerando não só União como Estados e municípios. Isso, segundo ele, precisa ser repensado, pois já gerou hiperinflação no passado, com crise de balança de pagamentos e moratória como subprodutos.

“Temos agora assunto da mesma família”, aponta, referindo-se ao pagamento de precatórios no orçamento de 2022. “É uma dívida que foi imposta por perda de última instância [na Justiça] sem mais recursos, e me parece que não há alternativa correta senão pagar.”

O teto de gastos, diz ele, foi desenhado para possibilitar e provocar reformas. “Algumas aconteceram, mas não o suficiente. O desenho do regime fiscal deverá ser repensado outra vez.”

Há necessidade, diz Arminio, de um sistema que dê previsibilidade e confiança no longo prazo, com endividamento administrável. Ficou muito claro, avalia, durante a pandemia, que o governo precisa ter flexibilidade não somente do ponto de vista fiscal e contábil, mas também do social. “Para ter isso nos momentos difíceis é preciso economizar, ter uma certa gordura”, analisa.

É preciso, salienta ele, voltar a ter saldos primários positivos, com governo sustentável do ponto de vista financeiro a médio e longo prazo. “Sem isso, não há confiança para investimento. O mundo de private equity no Brasil está brilhando apesar das incertezas.”

É preciso, porém, segurança para isso e o regime fiscal é crucial, diz. “Isso está no buraco desde 2014 e é essencial o próximo presidente dar uma arrumada na casa.”

Arminio destacou que o Brasil como um todo vem investindo “muito pouco há muito tempo”. “O investimento estrangeiro até tem sido bem resiliente no Brasil, o que não está arrancando é o nosso”, avalia. Hoje, destaca, estamos em círculo vicioso no qual há muita incerteza.

“O sistema político nos últimos 30, 40 anos não foi capaz de repensar o país de forma a gerar mais investimentos, aproveitando oportunidade para ganhos de produtividade”, aponta. “Quase tudo no Brasil é mais ou menos”, diz ele, ressaltando que há muito espaço para melhorar.

É preciso, diz ele, melhorar a qualidade da educação, levantar capital com regras e horizontes claros, ter confiança maior no longo prazo no Brasil para investimento em infra-estrutura, reforçar a conexão com o mundo.

Como uma das medidas para melhorar o gasto público, o economista defende a reforma administrativa, o que ajudaria a sanear um quadro no qual a maior parte do recursos é destinada para Previdência e folha de pagamentos. ”Há problema de prioridades”, diz.

A questão do funcionalismo público não é algo que se corrige rapidamente, reconhece, mas há espaço muito grande para reformas importantes. “Há espaço para reforma administrativa muito caprichada.”

Ele ressalta que não vê impactos rápidos disso, mas efeitos importantes do ponto de vista qualitativo e quantitativo. “O Estado está muito disfuncional e isso ajuda num desenho que seria um gestão de RH.”

As declarações foram dadas em evento virtual esta manhã promovido pela Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP).

Arminio Fraga, economista e sócio-fundador da Gávea Investimentos — Foto: Leo Pinheiro/Valor