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pedro.paulo

Assessor da Presidência na Fundação Getúlio Vargas (FGV), Doutor em Economia  pela Princeton University, Mestre em Economia Matemática pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) e Graduado em Engenharia Naval pela UFRJ. É membro do Senior Advisory Board na Empresa Oliver Wyman – Consultoria internacional especializada em riscos, na área financeira, e tecnológica, sócio da Tiba Assessoria Empresarial, presidente do Conselho de Administração do IMPA-OS e professor na FGV/EPGE.

Foi Diretor de Política Econômica do Banco Central do Brasil, Diretor Adjunto e Diretor Executivo do Banco BBM S.A e Diretor Executivo e Vice-Presidente Executivo do Itaú/Itaú Unibanco S.A

Participou de diversos conselhos e atualmente é membro do Conselho do ORT/RJ (Sociedade Israelita Brasileira de Organização, Reconstrução e Trabalho) e Conselheiro do MAM-SP (Museu de Arte Moderna de São Paulo). 


Resumo:

Transparência do Bacen, atas do Copom, relatório da inflação, pesquisas de expectativas, termos que refletem a abertura do Banco Central e que podem soar de forma comum hoje, são produto da implementação do sistema de metas para inflação no Brasil. Com detalhes, o economista e ex-diretor do Banco Central do Brasil, Sérgio Werlang, traz sua contribuição ao Podcasts da Casa das Garças sobre esse processo que mudou a forma de gerir a política monetária no Brasil, a partir de 1999.

O convite para implantar o sistema que transformaria a gestão da política monetária 

Armínio Fraga, novo presidente do Banco Central, convida Werlang a ocupar a diretoria de política econômica do Banco Central (1999). O objetivo era desenvolver um sistema de metas para inflação, que já fora adotado em países como Nova Zelândia e Inglaterra, todos com problemas cambiais, à semelhança do Brasil. O BC deixava de controlar a moeda e passava a controlar a inflação através da taxa de juros. A implementação do regime de metas exigiu uma transformação do Banco Central em sua visão, atitudes, métodos e instrumentos. O primeiro desafio residiu em convencer os técnicos do Banco Central da eficácia do novo regime de metas, dada a tradição monetarista de controle dos agregados monetários. Outro fator, pouco mencionado, mas também de grande apreensão, era a inexistência de programas do FMI que seguissem o regime de metas para inflação. E havia ainda o problema do câmbio, que dificultaria a previsão do modelo de inflação, já que a saída do regime de câmbio fixo veio acompanhada de um overshooting. 

A criação do departamento de pesquisa e o processo de abertura do Banco Central

Para o funcionamento do novo sistema era essencial não só a criação, mas também a adaptação periódica de modelos dentro do Banco Central, sem que houvesse a dependência de consultoria externa. Além disso, era preciso convencer os monetaristas influentes do Bacen sobre as qualidades do novo regime. É criado, em 1999, o Departamento de Estudos e Pesquisas do Banco Central, que viria a ser chefiado por Alexandre Tombini. O grupo de pesquisadores gerou o expertise necessário ao suporte ao regime de metas e desenvolvimento de novas ferramentas de comunicação com o mercado, a exemplo do sistema de coleta de expectativas e documentos relacionados às decisões do Copom. 

A experiência internacional como atalho para o novo regime de metas no Brasil 

O novo regime se beneficiou do acesso a experiências internacionais. Um dos marcos foi a realização, em conjunto com o FMI, de Seminário sobre Metas para Inflação, que reuniu países como Nova Zelândia (1989), Chile (1991), Inglaterra (1992) e Suécia (1993). Deste seminário ficou evidente que, mesmo em uma economia emergente, era possível adotar e fazer funcionar o novo sistema; a discussão conjunta ajudou a consolidar o apoio e a confiança do FMI, para a implementação do modelo. A essa iniciativa, somem-se as visitas de estudos e o apoio recebido do Banco da Inglaterra.

O processo de comunicação como um pilar 

Entender o sistema de metas é, na verdade, compreender a importância de se coordenarem as expectativas. A comunicação teve um papel central no novo regime desde seu início, já que a hesitação com o novo regime criaria um alto custo macroeconômico, e era preciso dialogar com o mercado para convencê-lo sobre o novo sistema. Inicialmente divulgada em duas semanas e, após, em uma – a divulgação de atas por parte do Comitê de Política Monetária (Copom) constituiu um grande passo para o processo de comunicação. Outro fator importante para a aceitação do plano foi o intenso programa de divulgação, que tinha como base a realização de inúmeras apresentações do presidente e diretores para o mercado, jornalistas e a sociedade em geral.

Os desafios para o regime de metas 

O que se espera, no futuro, para o Banco Central, é uma melhor acomodação do regime de metas com a realidade macroeconômica do País, já que não basta replicar a taxa esperada de um país vizinho, como o Chile, onde se enfrenta um cenário fiscal diferente do Brasil. O Brasil enfrenta restrições institucionais, a exemplo das despesas com o funcionalismo público, uma vez que não se pode demitir, tampouco reduzir o salário do funcionário público, restando a inflação e o reajuste salarial abaixo da inflação como soluções ao problema fiscal¹. Outra mudança recomendada é uma maior transparência do Banco Central, tanto na divulgação dos votos quanto dos modelos. Para os votos, espera-se maior detalhamento nas divulgações, posto que, apesar das divergências internas no BC, o que se verifica apenas é uma exposição de votos unânimes. A publicação de modelos mais transparentes também seria desejável, permitindo que possam ser replicados e aperfeiçoados por analistas externos. A evolução do regime de metas no Brasil está atrelada a metas de inflação realistas, transparência sobre os  votos e  divulgação dos modelos utilizados pelo Bacen.

A arte da política econômica: atenção às bases tradicionais da macroeconomia e adaptações à realidade

Apesar das novas correntes e formas de se pensar macroeconomia, a base keynesiana deve ser respeitada, pois, mesmo passíveis de imprecisões e limitações, os modelos macroeconômicos tradicionais neokeynesianos ainda são os mais confiáveis. Para a arte de se fazer política econômica, é importante também saber adaptar os modelos à realidade.  Um bom exemplo está na adaptação dos modelos a choques macroeconômicos ainda não modelados, como o do Covid-19. O caminho, portanto, é sempre tentar usar modelos com coerência e atualizar o conhecimento externo de forma contínua.

¹hipótese formalizada, para além de outros autores, por Aluísio Araújo em 2019, no artigo Teoria Econômica com Fragilidade Fiscal – disponível em https://www.scielo.br/pdf/rbe/v73n3/0034-7140-rbe-73-03-0281.pdf


Leituras sugeridas:


Working paper #1 do Banco Central do Brasil “Implementing Inflation Targeting in Brazil”, por Sérgio Werlang, Alexandre Tombini e Joel Bogdanski. Publicado em julho de 2000. 
Disponível em https://www.bcb.gov.br/pec/wps/ingl/wps01.pdf

Working paper #140 do BCB “Inflation Targeting, Credibility and Confidence Crises”, por Aloisio Araujo e Rafael Santos. Publicado em agosto de 2007. 
Disponível em https://www.bcb.gov.br/pec/wps/ingl/wps140.pdf

“Forward Guidance by Inflation-Targeting Central Banks”, por Michael Woodford. Publicado em novembro de 2013. 
Disponível, por login, em https://cepr.org/active/publications/discussion_papers/dp.php?dpno=9722

Handbook “Inflation Targeting”, por Lars E.O.Svensson. Versão publicada em outubro de 2010. 
Disponível em https://larseosvensson.se/files/papers/HandbookIT.pdf

“Mervyn King: Twenty years of inflation targeting”, por Mervyn King. Extraído da palestra Stamp Memorial em outubro de 2012. 
Disponível em https://www.bis.org/review/r121010f.pdf

“Targeting Inflation: The United Kingdom in Retrospect”, por Andrew Haldane. Usado no primeiro seminário anual de metas para inflação do BCB em 1999. 
Disponível em https://www.bcb.gov.br/Pec/Depep/Seminarios/1999_ISemAnualMetasInflBCB/Arquivos/1999_SemMetasInfl_AndrewHaldane.pdf

“The Past and Future of Inflation Targeting: Klaus Schmidt-Hebbel and Martín Carrasco”. Publicado em abril de 2016. 
Disponível em https://www.bcb.gov.br/pec/depep/Seminarios/2016_XVIIISemAnualMetasInfBCB/SMETASXVIII-%20Klaus%20Schmidt.pdf

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