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“A Primeira Lei Fundamental da estupidez humana assevera sem qualquer grau de ambigüidade que: Sempre e inevitavelmente, cada um de nós subestima o número de indivíduos estúpidos em circulação.”
Carlo M. Cipolla, As Cinco Leis da Estupidez Humana
Sempre que fico assoberbada pelas tolices a que somos submetidos incansavelmente, recorro ao delicioso livrinho de Cipolla. Afinal, tudo acontece por um motivo, mas muitas vezes o motivo é a mais pura estupidez, a total incapacidade de fazer boas escolhas.
Pensaram no Ministério que cai de Michel Temer, governo transitório, governo-trans, doença coronariana aguda à vista? Consideraram a possibilidade, ainda baixa, porém não-negligenciável de que Dilma seja absolvida em meio aos áudios comprometedores que envolvem ministros-políticos e a alma do PMDB? Pois enquadrem tais possibilidades na lei acima. Enquanto isso, hei de discorrer sobre ao menos uma escolha estúpida que assombra o mundo.
No dia 23 de junho, daqui a pouco mais de três semanas, os britânicos haverão de escolher se querem ou não a permanência do Reino Unido na União Europeia. O debate, que nada tem de novo, ganhou ímpeto temerário desde o agravamento da crise migratória na Europa, ante a falta de estratégia clara que os políticos do “continente” têm revelado não só para resolver esse, como para atenuar outros problemas da região. A Grécia é a eterna obviedade, mas não se trata só da Grécia. A demora para avançar na necessária união bancária, com a imposição de regras e regulações que não agradam a Inglaterra, cujo PIB ainda é muito dependente dos serviços financeiros apesar dos abalos sofridos pela crise financeira internacional, é outra razão para o descontentamento. Há percepção crescente entre os britânicos de que a Europa é mais fardo do que benefício, mesmo com os esforços do Primeiro Ministro David Cameron, e do agora aliado inusitado Sadiq Khan, prefeito de Londres e membro do Labour Party – o muçulmano recém-eleito que surpreendeu o mundo – de contrapor tal visão.
O que está em jogo caso a Inglaterra saia da União Europeia? Por certo, a solidez da atividade e do mercado de trabalho. Movimentos contrários à integração – ou, a desintegração – não tendem a trazer benefícios. O que antes se fazia com facilidade – o comércio com a Europa, por exemplo – ficará mais complicado, afetando a recuperação do Reino Unido, repercutindo no mercado de trabalho. Haverá sentimento crescente de que a Inglaterra é ambiente mais arriscado, aumentando a volatilidade dos mercados, como já se vê nos spreads de juros e no câmbio. No fim, é provável que o Banco da Inglaterra tenha de aumentar, e muito, as taxas de juros para estancar a volatilidade e a desvalorização da libra, com os efeitos já conhecidos sobre a atividade e o emprego. O Reino Unido passará a ser destino menos atraente para grandes empresas estrangeiras, ou mesmo britânicas, que, por certo, haverão de escolher países membros da UE para os seus negócios, diante da maior facilidade para conduzi-los e dos mercados ampliados que a Inglaterra não mais haverá de prover. Nada disso, entretanto, tem ressoado com o devido vigor entre o povo que haverá de escolher em poucas semanas o destino da ilha. Prevalece a desconfiança em relação aos seus governantes, aos líderes da Europa, e ao temor tácito de que a crise migratória venha a afetá-los – a eles e seus empregos, a eles e à capacidade de que o Estado possa prover serviços para todos. Ainda que tenham sido muito poucos os imigrantes a cruzar o Canal da Mancha, refugiados do Estado Islâmico.
Do outro lado do oceano, a escolha estúpida é aquela que se torna cada dia mais provável: Trump, presidente dos EUA. Fica para outro artigo análise sobre o pós-novembro, sobre mundo com Trump. Contudo, fica o alerta: os EUA estão cada vez mais inclinados a escolher alguém cujo preparo para exercer o cargo mais alto do país é inexistente.
Sentiram algum consolo em relação às escolhas de Temer? Algum schadenfreude, conforto proveniente das escolhas estúpidas dos outros? Nem eu.
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