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Com Camilo Santana e Izolda Cela na liderança no Ministério da Educação (MEC), surge a esperança de que o País consiga, finalmente, enfrentar o grave problema do analfabetismo funcional, em que as crianças permanecem na escola mas não aprendem a ler nem escrever como deveriam. Eles trazem a experiência do Ceará, que tem conseguido dar às crianças das escolas municipais de uma das regiões mais pobres competências de linguagem e matemática equivalentes às dos Estados mais desenvolvidos. O segredo é uma ação sistemática e persistente que combina materiais pedagógicos estruturados, com o uso de componentes fônicos, e forte integração entre as redes municipais e o governo do Estado, com avaliações permanentes, apoio e estímulo ao bom desempenho.
A esperança é que a mesma atitude inovadora que transformou a educação fundamental no Ceará possa ocorrer nos outros níveis da educação, em que, é preciso reconhecer, a experiência dos governos do Partido dos Trabalhadores (PT) desde 2003 deixou muito a desejar. Entre 2002 e 2015, o orçamento do Ministério da Educação passou de R$ 18 bilhões para R$ 180 bilhões ao ano, as redes públicas se expandiram, a escolaridade cresceu, mas a qualidade da aprendizagem aumentou muito pouco, e a produtividade do País se manteve estagnada. Ao final do ensino fundamental, no 9.º ano, continuamos entre os piores países do mundo na avaliação internacional do Pisa, e muitas crianças já ficaram para trás; temos uma reforma do ensino médio mal iniciada em 2017, que ficou pelo caminho; e um sistema de educação superior ainda moldado em uma legislação de meio século atrás, em que metade dos estudantes que entram não terminam, e metade dos que terminam não conseguem um trabalho de qualificação correspondente a seus títulos. Temos também um sistema de pós-graduação e pesquisa caro que se expandiu, mas com resultados sofríveis em termos de qualidade da pesquisa e impacto na inovação e na melhoria da qualificação geral da força de trabalho do País.
Para cada uma dessas áreas existem diagnósticos que precisam ser aprofundados e ações a serem feitas que precisam ir muito além da simples reconstrução do desastre administrativo e financeiro dos anos de Jair Bolsonaro. A reforma do ensino médio precisa ser completada, com a implantação de percursos de formação diferenciada, reforço da educação técnica e um novo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) compatível com um sistema de formação plural.
No ensino superior, a expansão das universidades e institutos federais levou a um sistema caro e pouco eficiente. A última reforma do ensino superior brasileiro vem dos anos 1960, antes que a demanda por educação superior começasse a aumentar, e nenhum governo desde então se empenhou em ampliar a diferenciação do sistema público, fora dos bacharelados e licenciaturas tradicionais, nem conseguiu regular o sistema privado. O regime de cotas não foi suficiente para dar acesso aos estudantes mais carentes, que acabam sendo atendidos, de forma precária, por um sistema privado comercializado que hoje cobre mais de 75% das matrículas. Dos 8.5 milhões de estudantes de nível superior em 2021, 1.3 milhões vinham de domicílios com renda per capita de meio salário mínimo ou menos, e, destes, dois terços estavam no setor privado (dados da Pnad Continua de 2021).
É preciso identificar com clareza as diferentes missões das instituições públicas – ensino profissional, formação tecnológica, pós-graduação e pesquisa, desenvolvimento regional, formação de professores – e dar a cada uma estímulos e autonomia apropriados para que façam melhor o que esteja a seu alcance, e não desperdicem recursos naquilo que não querem e não podem fazer. O setor privado precisa ser mais bem regulado, o atual sistema de credenciamento e avaliação do ensino superior está obsoleto, e existem propostas para sua revisão que precisam ser aprofundadas e implementadas.
O modelo elitista permitiu que o Brasil desenvolvesse um setor razoável de pesquisa e pós-graduação das universidades públicas, mas concentrado em poucas instituições. Já é tempo de desfazer o sistema excessivamente centralizado e burocratizado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), também concebida há 70 anos atrás e que não cumpre mais seus objetivos. A ideia de que a pós-graduação e a pesquisa são duas faces da mesma moeda é tão obsoleta quanto o antigo mantra da “indissociabilidade do ensino e da pesquisa”, que diziam que existia nas universidades alemãs de 200 anos atrás, e que persiste em nossa legislação. É verdade que a maior parte da pesquisa brasileira de qualidade ainda ocorre nas principais universidades, mas tem pouco impacto, e a maioria dos cursos de pós-graduação hoje, sobretudo de mestrado, é de qualificação profissional.
Pelos dados mais recentes da PNAD contínua do IBGE, haviam, em 2021, 1.315 mil estudantes em cursos de especialização “lato senso”, não regulados, sobretudo no setor privado; e 280 mil em cursos de mestrado e 175 mil em cursos de doutorado regulados pela CAPES, estes sobretudo no setor público. Como se pode ver no gráfico acima, a renda domiciliar per capita destes estudantes de pós-graduação é duas ou três vezes maior do que a dos estudantes dos cursos superiores, os quais, por sua vez, têm renda domiciliar duas vezes maiores do que a dos estudantes de nível médio. São estudantes de famílias de alta renda que podem precisar de financiamento, mas não precisam de bolsas para estudar nem da regulação que tolhe a autonomia das instituições de encontrar seus próprios caminhos. A pesquisa e a formação de alto nível precisam de apoio e incentivos, mas isso não se faz pela centralização burocrática e pulverização de recursos em dezenas de milhares de bolsas de estudo para todo tipo de cursos.
A nova equipe do MEC tem todas as condições para reconhecer esses problemas e buscar novos caminhos. Tomara que consiga.
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