Livro mostra crônicas do Real ao longo de 30 anos


Um debate na Casa das Garças, no Rio, marcou o pré-lançamento do livro “30 anos do Real: crônicas no calor do momento”, que reúne uma coletânea de artigos escritos nas datas de aniversário do real por alguns dos economistas que implantaram o Plano Real: Pedro Malan, Edmar Bacha e Gustavo Franco. Eles afirmam que nunca houve tanto interesse no plano econômico como agora no seu aniversário de 30 anos. O real começou a circular em 1º de julho de 1994.

 

A obra foi organizada pelo integrante da equipe econômica desde o início e que depois assumiu a presidência do Banco Central, Gustavo Franco. Para ele, esse maior interesse provavelmente acontece pela atual “angústia” no cenário econômico. Ele reforça, no entanto, que, olhando em retrospectiva, todos os problemas enfrentados pelo real parecem passageiros:

— O olhar se modifica após 30 anos, resgatando a ansiedade desses momentos e vendo onde estamos hoje. Trinta anos é o tamanho da conquista do plano. É simbólico recuperar a moeda, que é a convergência de todas as humilhações econômicas do país, sua perda de valor reflete na perda da cidadania e afeta o país de muitas maneiras.

Pedro Malan, que também estava desde o começo do plano e que assumiu o Ministério da Fazenda nos dois governos de Fernando Henrique Cardoso, vê que as diversas comemorações dos 30 anos do Plano Real representam um reconhecimento do trabalho feito e que a estabilidade de preços é uma responsabilidade do governo:

— Inflação sob controle é uma demanda da sociedade, é a preservação do poder de compra do salário do trabalhador brasileiro. E não foi uma solução que surgiu de uma hora para outra, mas pelo menos uma década de debates acadêmicos e lições das experiências dos outros planos, como Cruzado, Plano Bresser — diz.

Política e técnica

Edmar Bacha, que também esteve desde o início na equipe que elaborou e pôs em prática o plano e presidiu o BNDES, avalia que a importância do controle da inflação está consolidada na sociedade brasileira. Ele diz que o povo percebeu sua capacidade de controlar os preços através do processo eleitoral e que a estabilidade de preços veio para ficar:

— O povo negou o terceiro mandato ao PSDB (quando a inflação chegou a 12% em 2002) e apoiou a saída da Dilma (Rousseff que sofreu impeachment em 2016, no ano anterior a inflação chegou a 10,67%), demonstrando que brincar com a inflação leva à perda de poder. E políticos brasileiros sabem que não devem brincar com a inflação se quiserem ser reeleitos.

 

O livro foi lançado pela editora Intrínseca e foi dividido em seis partes que retratam a trajetória do real a cada 15 anos.

— A grande lição é que o real é resultado de uma liderança que permitiu aliar a política com a competência técnica. Isso é um exemplo do que pode ser feito em termos de políticas públicas em outras áreas no Brasil — comenta Malan.

No lançamento do livro ontem houve um debate entre os criadores do plano, mediado pelo colunista do GLOBO Rogério Furquim Werneck. No contexto do debate sobre o controle da inflação, os economistas elogiaram a autonomia do Banco Central.

— É preciso criar instituições independentes do sistema político para garantir a manutenção do equilíbrio inflacionário, como demonstrado pelo Copom (Comitê de Política Monetária) nesta semana — ressalta Bacha, sobre a decisão do Copom, do Banco Central, de interromper o ciclo de cortes na Selic, em meio a críticas do atual governo, mantendo a taxa em 10,50% ao ano, por unanimidade.

— O livro se tornou extremamente oportuno, acompanhando desde o final do governo de Fernando Henrique Cardoso até hoje. Tudo indica que a condução coerente da política monetária e cambial independente da política partidária está longe de ser estabelecida — afirma Werneck.