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O crescimento econômico brasileiro pós Dilma tem sido decepcionante. Em boa medida, ainda arcamos com as distorções na alocação de recursos e no orçamento público decorrentes de políticas que buscaram estimular a economia através de uma atuação mais vigorosa das estatais e do aumento do gasto público, com a concessão de subsídios de crédito, isenções tributárias e aumentos no dispêndio primário. A bem da verdade, a guinada desenvolvimentista começou após a crise do Mensalão e em 2007 já se via o declínio do superávit primário. Foi acentuada em 2008 pelo início da política de turbinar o crescimento via crédito subsidiado do BNDES. O que era para durar um ano, virou permanente. Por causa de políticas equivocadas, tivemos a pior recessão do País desde a década dos anos 30. A herança de Dilma foi uma década perdida em dois anos, recorde de desemprego, uma crise fiscal sem precedentes e juros de 14,5% ao ano.
O controle fiscal e as reformas iniciadas pelo Governo Temer marcaram a inflexão desse processo. Saímos da recessão, mas o crescimento tem sido anêmico. O “Joesley gate” e a possibilidade de uma vitória do PT nas eleições de 2018 aumentaram a incerteza dos agentes econômicos e reduziram por consequência o investimento privado. O ano passado no entanto, que em princípio marcaria uma continuidade das reformas do Governo Temer, novamente decepcionou. Crescimento do PIB foi ainda inferior ao registrado na saída da crise em 2017, ficando perto de 1%, e a renda per capita não retornou ainda aos níveis de 10 anos atrás.
O que fazer para crescer de forma permanente mais do que temos crescido?
A resposta errada é tentar fazer de novo, e supostamente melhor, aquilo que já foi feito não deu certo no passado. Bolsonaro sempre foi estatizante. Pouco surpreende que seu governo, ao anunciar o Plano Pró-Brasil, busque crescer através de investimentos públicos e de uma atuação mais vigorosa das estatais. O Plano Pró-Brasil tem sido justamente apelidado de PAC; a mentalidade desenvolvimentista da década dos anos 70, quando dos grandes Planos de Desenvolvimento anunciados pelo governo militar, é curiosamente similar às ideias frequentemente entretidas pela esquerda quando o tópico é crescimento econômico. O resultado é a perda de eficiência decorrente da má alocação de recursos e, na dinâmica da economia política dos trópicos, benefícios aos grupos privados capazes de ter acesso e influência nas decisões governamentais. As centenas de bilhões despejados por Dilma no BNDES – a bolsa empresário – exemplificam de forma contundente esses equívocos de política econômica. Há situações específicas em economia, caracterizadas pela incerteza quanto ao futuro, em que o aumento keynesiano de gastos tem efeitos positivos. Mas não é o caso da economia brasileira hoje nem foi no passado.
A segunda resposta, meio certa, é acreditar que basta fazer um ajuste fiscal para que o País cresça. O conceito decorreria do que economistas chamam de “crowding out”: o déficit público reduz o investimento privado produtivo porque absorve em seu financiamento a poupança que de outra forma estaria disponível para financiar o investimento. Bastaria o governo sair para que o setor privado entrasse em seu lugar. O menor gasto público melhoraria as expectativas do setor privado, reduzindo os prêmios de risco e a taxa de juros. O crescimento do consumo e do investimento privados mais do que compensariam a contração dos gastos públicos. É como se houvesse um efeito multiplicador negativo dos gastos públicos: quanto menor o gasto público, maior a demanda agregada e o crescimento.
O efeito do multiplicador negativo depende de dois fatores. Primeiro, da narrativa vigente sobre o modo de funcionamento da economia. Os agentes precisam ficar mais otimistas quando o gasto público é reduzido. Segundo, requer que o aumento nos gastos e investimentos do setor privado mais do que compense a redução nos gastos públicos. Como as decisões do setor privado não podem ser impostas por decreto, essa segunda condição pode ocorrer ou não.
A experiência de 2019 põe em dúvida a magnitude do impacto da tese do multiplicador negativo. A aprovação da reforma da Previdência e a a PEC do Teto dos gastos do governo Temer foram fundamentais para as quedas nas taxas de juros. O investimento privado, no entanto, se mostrou pouco sensível ao estímulo monetário. O discurso oficial do Governo Bolsonaro é que, se nós não tivéssemos sido atingidos pelo Coronavirus, teríamos iniciado em 2020 um processo virtuoso conduzido pelo investimento privado que nos levaria a um patamar mais elevado de crescimento. Mas há uma diferença importante entre uma recuperação cíclica, que possivelmente teria garantido um crescimento em torno de 2% nesse ano, e um crescimento permanentemente mais elevado. Os indicadores econômicos de janeiro e fevereiro, antes do impacto da epidemia, apontavam para uma recuperação cíclica nesse ano, não para uma mudança permanente no patamar de crescimento.
A tese desenvolvimentista, a meu ver, está equivocada por inteiro. No Brasil de hoje, não faz sentido ter que endividar mais o governo para lançar um programa de investimentos públicos. A tese do multiplicador negativo é meio certa. Não tem erro lógico em sua formulação mas seu impacto efetivo não pode ser previsto a priori. Quanto maior a incerteza jurídica na execução de contratos, por exemplo, menos relevante se torna a tese do multiplicador negativo. Sua limitação maior, no entanto, está em enfocar somente um dos aspectos do problema do crescimento.
Crescimento depende de mais investimentos mas também de uma economia mais produtiva. Produtividade significa gerar mais produto com o mesmo volume de investimentos. Para que o Brasil cresça ao seu máximo potencial, é crucial ter ganhos de produtividade.
Nossa economia tem apresentado ganhos de produtividade muito decepcionantes. Uma coisa é o necessário equilíbrio nas contas públicas. Outra coisa é tornar a economia mais produtiva. A agenda da produtividade vai além da agenda fiscal.
Quais as reformas necessárias para ganhar produtividade? Precisamos de avanços no mercado de capitais, de uma lei geral de garantias, de um bom marco regulatório para o saneamento e para investimentos em infra-estrutura em geral e de mais certeza jurídica na execução de contratos. Há muito o que fazer do ponto de vista jurídico e normativo para criar um ambiente de negócios favorável ao investimento. Além disso, a agenda de produtividade se desdobra em mais cinco vertentes: (a) Abertura comercial e de serviços préanunciada e profunda, ainda que unilateral; (b) Reforma administrativa radical para aumentar a produtividade do setor público; (c) Um programa de privatizações de envergadura atingindo as grandes estatais para evitar que parte substantiva do aparato produtivo seja regido por regras outras que não a busca da eficiência econômica; (d) Uma reforma tributária que, além do IVA, elimine regimes de tributação favorecida; (e) Uma educação pública de qualidade.
Apesar do prometido na campanha e tantas vezes alardeado ao longo do ano passado, quase nada aconteceu no campo da agenda da produtividade. A Reforma da Previdência só foi aprovada graças ao empenho do Presidente da Câmara e o governo entrou em letargia desde então. Seus projetos de Reforma Administrativa e de Reforma Tributária, se é que existem, nunca foram enviados ao Congresso. A abertura se limitou a completar o acordo do Mercosul com a União Européia – um acordo que já nasceu velho posto que negociado por mais de 20 anos e que dificilmente será ratificado após os ataques do Bolsonaro ao Macron e da política ambiental de seu governo que horroriza o mundo civilizado. A privatização não passa de uma reestruturação financeira das grandes estatais. O produto da venda de subsidiárias de estatais fica com a estatal, não vai para o Tesouro. O efeito disfuncional da presença de estatais continua. A educação pública está sendo gerida pelo pior Ministro da nossa história.
O Brasil terá mais crescimento quando aumentar o investimento privado e a produtividade dos setores públicos e privados. Essa é a resposta correta ao nosso desafio. Espero que seja implementada no próximo governo, a partir de 2023.
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