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Como preconizou José Saramago, “não tenhamos pressa, mas não percamos tempo”. A pouco mais de um ano para sediar a COP 30 em Belém (PA), não podemos deixar que a distância temporal nos faça retardar a definição de uma estratégia que nos permita protagonizar a agenda do mega evento de impacto global, que extrapolou em muito os limites das mesas de debates diplomáticos.
O trabalho realizado ao longo das Conferências da ONU sobre Mudanças Climáticas tem o mérito de introduzir o premente tema da emergência do clima na agenda de uma parcela importante da liderança planetária e dos diversos estratos da sociedade. Em três décadas, essa plataforma multilateral fez com que 200 países reunidos anualmente estabelecessem compromissos no combate e adaptação às mudanças climáticas. Após o marco da Rio 92, o ponto alto foi o Acordo de Paris em 2015. Agora, Belém pode ser igualmente histórica.
A despeito de avanços nas negociações, porém, a governança global falha ao não transformar os acordos em ações efetivas. A crise climática não será solucionada com medidas unilaterais, como temos presenciado. Os exemplos vêm, sem surpresa, daqueles que detêm o dinheiro — e o poder.
Os Estados Unidos lançaram o IRA (Inflation Reduction Act), plano de estímulo para desenvolvimento de energias limpas; são bilhões de dólares aportados para impulsionar a descarbonização e reforçar a segurança energética via incentivos financeiros. A União Europeia aprovou seu Green Deal, que cria exigências duras e controversas para importações realizadas pelos países do bloco, entre outras medidas. Já a China tem investido pesadamente na mudança de sua matriz energética, sobretudo em energia solar e carros elétricos.
Esses países mobilizam recursos vultuosos, em escala que o Brasil não dispõe para se igualar na disputa pelo mercado verde. Acumulamos dívidas, problemas fiscais e de infraestrutura, além de nos encontrarmos em um quadro histórico sem vetores claros de liderança com visão de projeto de nação. É importante, antes de tudo, reconhecer isso.
Por outro lado, temos vantagens ambientais com força para nos posicionar como influenciadores reais desse debate. Precisamos fazer valer nossa riqueza ambiental. Abrigamos a maior floresta tropical do mundo, cerca de 20% de toda a biodiversidade do planeta e 12% das reservas de água doce. Nossa matriz energética é 47% renovável, índice invejável à maior parte do globo. E ainda podemos avançar, pois temos sol, ventos constantes em diversas regiões do país e uma experiência notável com biomassa, inclusive florestal.
Sem desconsiderar que no caminho para Belém tem Baku (Azerbaijão), sede da 29ª Conferência das Partes, a expectativa é que a COP a ser realizada em plena Amazônia, uma década após o Acordo de Paris, ofereça oportunidade singular para fazer todo o processo negociador avançar – não há mais tempo a perder! Entre os temas fundamentais estão a definição das novas NDCs, o alinhamento do financiamento climático, que teima em não deslanchar, e, espera-se, o encaminhamento da tão adiada regulamentação do mercado global de carbono.
Contra esse pano de fundo do protagonismo a ser desempenhado pelo Brasil – a rigor, em um ciclo já iniciado com a presidência do G20 e do BRICS+ – não podemos desperdiçar a oportunidade de estarmos no centro das atenções. Nesse sentido, termos aprovado o mercado regulado de carbono nacional é crucial. Precisamos de um marco legal que respeite a integridade climática e estimule a economia do baixo carbono no país, dialogando com modelos existentes ao redor do planeta e dando musculatura para os mercados voluntários já em operação, mostrando, enfim, que estamos preparados para o mercado global.
Também precisamos fazer nosso dever de casa e combater ilegalidades que nos fragilizam, como o garimpo, a grilagem e o desmatamento, praticados nos vários biomas, principalmente na Amazônia.
Em outra frente, não podemos perder de vista o mundo lá fora. Assistimos a recuos que podem mudar o tabuleiro geopolítico da corrida verde. A eleição europeia pode significar mudança de rumo das medidas construídas até aqui. Da mesma forma, a eleição presidencial norte-americana pode ensejar graves retrocessos, como já vimos acontecer nos EUA após a assinatura do Acordo de Paris em 2015. Outro ponto de atenção é a posição anunciada pelas petroleiras.
Tal cenário pode trazer armadilhas para o país. Realizar a COP 30 na Amazônia exige o enfrentamento de equívocos difundidos sobre nosso país e sobre o agro brasileiro. Temos a chance de trazer lideranças planetárias para a região da qual tanto falam, porém desconhecem. É a oportunidade de, definitivamente, inserir neste debate os cerca de 25 milhões de brasileiros e brasileiras, que, em boa parte, vivem o paradoxo da pobreza em meio à riqueza ambiental do bioma amazônico. Também não nos pode fugir do radar que fazer de Belém “apenas” a COP da Floresta pode sinalizar que países industrializados tem menor responsabilidade na crise climática.
Teremos à nossa disposição o momento e a força necessários para colocarmos à mesa a visão tropical sobre a questão climática, quebrando um ciclo duradouro de uma pauta baseada em referências e perspectivas do hemisfério norte. Países ricos sabem bem o que querem. A COP da Amazônia será o palco escancarado para o Brasil mostrar o que deseja.
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