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Neste 2024, o Brasil celebra os 30 anos da criação do Plano Real, o programa técnico-político que tirou o país da inflação crônica e da hiperinflação recorrente. Mas não se deve perceber esse aniversário como a lembrança de um acontecimento encapsulado no passado. Muito pelo contrário, pois estamos há três décadas usufruindo de avanços oriundos da implementação dessa ousada estratégia de rompimento de um flagelo nacional.
A inflação alta e a hiperinflação fizeram parte do cotidiano de gerações e gerações de brasileiros. Era algo, pode-se dizer, estrutural na vida política e econômica do país e que penalizava os pobres, num perverso círculo vicioso que fulminava o poder de compra de ampla maioria da população. O “inflacionismo” era um agente de injustiça social e vetor de empobrecimento do país.
Combinando a boa técnica, baseada em transição engenhosa de cenário de hiperinflação para um tempo de estabilidade econômica, e que inclusive incorporou aprendizados de experiências de planos anteriores, com a boa política, sustentada pelo diálogo e pelo convencimento da sociedade, de Poderes e instituições, a equipe, liderada por Fernando Henrique Cardoso operou “um antes e um depois” da vida nacional.
Com a efetivação do Plano Real, o Brasil deu início a um novo momento de sua história. Muito do que se conquistou nessas três décadas foi feito a partir de condições viabilizadas pela estabilidade da moeda, que não é tudo, mas que se coloca como condição crucial para avanços socioeconômicos.
Só para citar alguns exemplos relevantes, superamos a crônica fragilidade externa do nosso país —é só olhar o volume das nossas reservas internacionais e o saldo da balança comercial; conseguimos modernizar a nossa autoridade monetária, chegando a ter um Banco Central independente; trouxemos crescentemente o capital privado para suportar a melhoria da infraestrutura no país; levamos as crianças em idade escolar para as escolas e instituímos uma rede de proteção social.
Evidente que restam tarefas que são inadiáveis, como o equilíbrio fiscal, sempre postergado; a conclusão da reforma tributária; a reforma do RH do setor público brasileiro e levar qualidade para a educação básica no país, entre outros desafios.
Testemunhei e participei das transformações e desafios da implementação do Plano Real num lugar muito especial: o Executivo municipal.
Era prefeito de Vitória entre 1993 e 1996 e foram imensas adaptações que tivemos de promover naquele momento, não obstante os aprendizados auferidos tenham sido de crucial valia para a minha caminhada de gestor público e também na atividade privada.
No período de transição da moeda, com o uso da URV (Unidade Real de Valor), o trabalho foi hercúleo, notadamente na conversão da folha de pagamento. Os sindicatos reivindicavam a conversão pelo pico dos salários, enquanto a realidade prescrevia a conversão pela média.
Nesse processo, tive de enfrentar uma greve de servidores. Aqui também a saída exigiu diálogo e convencimento, a partir dos fatos e da transparência dos números.
A outra interrogação que se abria era como se comportariam as receitas governamentais com a estabilidade da moeda, já que essa realidade abolia uma fonte que era comum aos órgãos públicos os rendimentos na jogatina da ciranda financeira.
O caminho foi feito passo a passo, com planejamento e organização, o que acabou produzindo um ganha-ganha, com satisfação à sociedade e ao funcionalismo. Medida disso foi que terminamos como uma das administrações municipais mais bem avaliadas no país.
A experiência e os conhecimentos acumulados num momento tão rico e decisivo para o país foram essenciais para os próximos passos da minha vida pública pública.
Exemplo de aplicação desse treinamento foi a travessia exitosa que liderei de uma das piores fases da história capixaba, a partir de 2003. Sob a sombra do crime organizado, o governo estava destroçado, sem condições sequer de honrar com a folha de pagamento dos servidores, que tinham três salários em atraso quando assumi.
Agora em 2024, ano de eleições municipais, a história de superações e conquistas viabilizadas pelo Plano Real tem muito a inspirar candidatos.
Dentre várias questões a se notar, estão os fatos de que controle de inflação se tornou um valor para a nossa população, que estabilidade monetária é fator de indução de prosperidade, que equilíbrio financeiro-orçamentário é uma conquista republicana de respeito e incremento da cidadania, e que a boa política faz parceria luminosa com a boa técnica.
Mas também é preciso entender que os ganhos possibilitados com o Plano Real, como a estabilidade monetária e o controle da inflação, não são conquistas pétreas, apesar de seu valor inestimável. São medidas que precisam ser sustentadas dia a dia pela ação política responsável, imunizada de velhas pragas, como o populismo fiscal, por exemplo.
O dragão da inflação, para lembrarmos uma expressão de que os mais jovens nunca ouviram falar, mas que povoava os piores pesadelos de muitos brasileiros, é um monstro que pode ser facilmente ressuscitado, especialmente com os perversos resultados das gastanças e dos descontroles das contas públicas. Aqui também vale a máxima de que só cuida do povo, especialmente os empobrecidos, quem cuida das contas.
Se hoje a preocupação é manter a inflação nas cercanias de uma meta de 3% ao ano, é preciso lembrar que, nas décadas anteriores ao Real, a inflação média era de 16% ao mês, com o pico da hiperinflação de 82% em março de 1990. Ou seja, somente por números como esses, já se tem em conta o valor do Plano Real para o Brasil.
Dessa sorte, é que se trata de um momento de comemorações, sim, mas que deve, antes de tudo, nos manter comprometidos com os fundamentos do Real, além de nos inspirar no cumprimento da gigantesca tarefa de modernizar o país. Afinal, como se provou há 30 anos, temos plena possibilidade e capacidade de promover novos inícios transformadores de nossa história.
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