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“Nós temos mais três anos pela frente e queremos ter algo concreto para a sociedade brasileira aprovar (em 2026). O nosso problema era dinheiro e dinheiro não é mais problema.” Assim falou Lula em 22 de janeiro de 2024, na cerimônia de lançamento do Programa Nova Indústria Brasil (NIB).
O NIB define seis grandes missões: construir cadeias industriais sustentáveis, consolidar o complexo industrial da saúde, desenvolver a infraestrutura, promover a transformação digital, desenvolver a bioeconomia e desenvolver tecnologias estratégicas. A opinião pública foi informada de que o plano será guiado por “diretrizes transversais” como inclusão, equidade de gênero, cor e etnia e promoção do trabalho decente. O leque de instrumentos é amplo: subvenções, créditos tributários, participações acionárias, requisitos de conteúdo local, entre outros.
O programa será implementado simultaneamente ao novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Este velho novo PAC tem seis eixos, alguns dos quais semelhantes àqueles da NIB, como transição energética, transporte, inclusão digital e conectividade. Parece haver um problema de governança e falta clareza sobre as implicações orçamentárias da implementação simultânea dos dois programas. Ainda assim, nesta última semana o presidente Lula já declarou ver espaço para um aumento de gasto; e o fez com base apenas na arrecadação extraordinária no mês de janeiro.
O otimismo de Lula pode ser contagiante. Exatamente há um ano, afirmava: “Quando completarmos cem dias, teremos voltado com todas as políticas públicas que deram certo neste país”. É preciso reconhecer, justiça lhe seja feita, que há coerência e consistência em sua visão ao longo do tempo. Em 2018, o livro Luiz Inácio Lula da Silva: A verdade vencerá (Editora Boitempo) trazia rodadas de conversas com interlocutores diversos. A propósito de decisão tomada por Dilma Rousseff em 2014, Lula diz: “Eu, sinceramente, jamais apresentaria um orçamento negativo. Eu teria anunciado: ‘Este país tem tantos bilhões de dólares de reserva, este país tem tantos bilhões de compulsório no Banco Central não rendendo nada, nós vamos pegar esse dinheiro’. Fazer como eu fiz na marolinha de 2008, quando peguei R$ 100 bilhões e coloquei no BNDES. (…) Para gerar emprego, tem que ter desenvolvimento; para ter desenvolvimento, tem que ter crescimento; para ter crescimento, tem que ter dinheiro! Não precisa ir para a universidade para saber disso”. Em setembro de 2009, em imperdível entrevista ao jornal Valor, Lula afirmara: “Eu acho que a gente não deveria ficar preocupado em saber quanto o Estado gasta. Eu acho que a preocupação é se o Estado está cumprindo com suas funções de tratar bem a população”.
No mesmo livro, Lula pontifica sobre o critério de escolha de um ministro da Fazenda: “Eu não quero um gênio para ser o responsável pela economia. (…) Eu quero um cara que execute a decisão política que o governo toma para a economia. Porque, se você não tem chefe, se esse chefe não dá ordem, se o chefe não tem objetivo e estratégia, cada um vai fazendo o que bem entende”.
Felizmente, o ministro Haddad, que bem conhece o presidente, tem sido habilidoso em lidar com esta questão não trivial. O ministro seguramente sabe que temos incertezas quanto ao lado das receitas e certezas quanto ao lado das despesas e dos gastos tributários. Receitas não recorrentes para cobrir gastos permanentes e crescentes. E um presidente que está convicto de que há gastos que não devem ser considerados como gastos, mas sim como investimentos que levarão inexoravelmente ao crescimento da economia, da renda e do emprego.
Em entrevista concedida à Folha em 27/1/2024, o ex-ministro e hoje diretor do BNDES Nelson Barbosa afirma que “erros do passado já foram reconhecidos e consertados”. Há controvérsias. Mas o autor reconhece que existem “também críticas válidas e vamos ouvir e aperfeiçoar”. Palavras importantes, porque seguramente haverá críticas válidas ao longo dos próximos três anos. Haverá, também, cobrança continuada por avaliação do desempenho dos inúmeros programas, algo que infelizmente não está na nossa tradição. Afinal, uma boa política deve ser medida por sua eficácia, e não pela expressão de sentimentos, desejos e objetivos por alcançar, meritórios como possam ser.
Concluo com André Lara Resende: “A combinação dos gastos e das receitas tributárias – a forma como o governo conduz a chamada política fiscal – é da mais alta importância para o bom funcionamento da economia. A preocupação dos formuladores de políticas públicas deve se concentrar não no financiamento das despesas públicas, e sim na qualidade dessas despesas. (…) Não apenas quanto o Estado gasta e tributa, mas sobretudo como gasta e tributa é da mais alta relevância. (…) O governo pode gastar mal, inflando os gastos com pessoal, criando uma burocracia incompetente e corporativista, subsidiando empresas improdutivas, mas ao menos em tese também pode gastar direito, investindo de forma competente, na educação, na saúde, na segurança e na infraestrutura”. Não é tarefa fácil – mas é indispensável que seja tentada.
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