Casa das Garças

Réplica: BNDES age como Robin Hood às avessas ao punir trabalhador e financiar empresa

Data: 

28/08/2019

Autor: 

Arminio Fraga Neto e Vinicius Carrasco

Veículo: 

Folha de São Paulo

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Joseph Stiglitz é um dos maiores economistas da história, conhecido por contribuições seminais em várias áreas da teoria e por sua posição progressista, que compartilhamos. Um de nós (AF) foi aluno dele, um luxo. Escrevemos esta nota em linha com o que cremos ele teria feito se melhor conhecesse o caso do BNDES.

 

O BNDES nasceu BNDE, para apoiar a fase inicial da industrialização por substituição de importações do Brasil, por meio da provisão de financiamento de longo prazo da moeda nacional, uma lacuna de mercado à época.

 

Embora o preenchimento dessa lacuna se justificasse plenamente, vinculá-lo a política industrial não é consenso (somos do time dos que discordam). Já à época havia consciência de que se tratava de estratégia temporária, de proteção à indústria nascente. Os anos foram passando, e a rodinha ficou para sempre: a criança ficou velha e nunca aprendeu a andar de bicicleta.

 

A introdução do S ao seu nome poderia tê-lo levado a resolver uma falha de mercado: viabilizar projetos cujos retornos sociais superassem custos privados, com esses maiores, por sua vez, que retornos privados (o que inviabilizaria provisão privada).

 

Mesmo não sendo necessariamente a melhor resposta (uma alternativa mais transparente seria usar subsídios vindos direto do Tesouro, em orçamento aprovado pelo Congresso Nacional), valeria a pena.

 

Seria de todo essencial que o desempenho do BNDES fosse avaliado a partir desse critério, mas tal nunca ocorreu. Há, no entanto, evidências claras de que a prática do banco combinou ineficiência econômica e concentração de renda.

 

A seguir um resumo do caso.

 

A principal fonte de financiamento do BNDES são os recursos do FAT, historicamente remunerados a taxas abaixo de mercado acessíveis aos trabalhadores.

 

Para financiar o PSI (Programa de Sustentação do Investimento), o Tesouro injetou quase R$ 500 bilhões no BNDES e arcou com a diferença entre o custo de seu financiamento e as taxas cobradas do banco.

 

A essas fontes de financiamento correspondeu, portanto, uma taxação de trabalhadores (FAT) e de todo cidadão brasileiro (o resto).

 

E para onde vão esses recursos? Para financiar i) projetos que ou não seriam levados a cabo não fossem os subsídios concedidos ou que poderiam ser financiados por alternativas de mercado e ii) aquisição de máquinas de produção nacional e estímulo a “conteúdo local”.

 

Projetos que não tem retorno social maior que privado e que e são só viabilizados por subsídio geram ineficiências: de estaleiros quebrados a projetos de infraestruturas superdimensionados (Viracopos é um exemplo), o BNDES foi pródigo em contribuir para a péssima alocação de capital que responde por parte relevante do crescimento medíocre de nossa economia nos últimos anos.

 

Financiar máquinas produzidas localmente inibe, por um lado, que produtores comprem máquinas de melhor qualidade de outros países, e, por outro, insula produtores locais da força competitiva que os estimularia a serem mais eficientes.

 

Para projetos que teriam condições de serem financiados por alternativas de mercado, a atuação do BNDES corresponde a transferência de trabalhadores e contribuintes aos acionistas das empresas financiadas.

 

Essa atuação concentradora de renda também ocorre de outra forma: o BNDES usa, quando financia aquisição de máquinas, os bancos comerciais para emprestar. É como se os bancos comerciais tomassem emprestado do BNDES para emprestar para o tomador final, Portanto, o crédito barato também é em parte apropriado pelos bancos.

 

Concluindo: o BNDES pune os trabalhadores e contribuintes que subsidiam seu custo de captação e oferece empréstimos subsidiados a empresas que, na maioria dos casos, deveriam se financiar sem subsídios, Trata-se, portanto, de uma política de Robin Hood às avessas.

 

Recentemente, financiamento pelo BNDES foi amplamente substituído por fontes privadas, desarmando argumentos de que crédito do BNDES é indispensável ao bom funcionamento da economia.

 

Estímulo à competição (como nas agendas BC+ e #, do Banco Central) e melhoras institucionais aprofundarão esse processo e gerarão, via democratização do acesso ao crédito e inclusão financeira, crescimento maior, mais estável eequitativo.

 

Stiglitz, em artigo publicado na Folha, acerta ao dizer que instituições importam. Faltou dizer que são aquelas que estimulam empreendedorismo, a eficiência e a disseminação da riqueza na sociedade as que geram desenvolvimento.

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