Tivemos que ancorar a inflação assim à solta, sem truque, sem nada


Em março de 1999, o dólar bateu sua cotação mais alta desde o início do Plano Real cinco anos antes. A moeda americana vinha disparando desde janeiro, quando, logo após a reeleição do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o governo decidiu acabar com o regime de bandas cambiais que vigorava desde o início do Plano Real e era a principal âncora para controlar a inflação mas, que, nos últimos meses, havia provocado uma sangria sem precedentes nas reservas internacionais do país.

 

A decisão do governo levou Gustavo Franco a pedir demissão do Banco Central, que ficou sob comando interino de Chico Lopes até Arminio Fraga assumir em 4 de março. Foram meses em que muitos acreditaram que o Plano Real iria à lona.

 

— O que eu tinha na cabeça era a experiência do México, que tinha acontecido exatamente quatro anos antes (a maxidesvalorização). E lá, a inflação chegou a bater, em 12 meses, 50%. O que a gente tinha na cabeça naquele momento era que, se chegar a 50%, vai indexar tudo e acabou o plano. A gente vai estar de volta à estaca zero ou até pior — lembra o economista na quarta entrevista de uma série com os principais personagens do Plano Real, que completa 30 anos em 1º de julho.

 

Logo após Arminio assumir, o BC elevou a taxa básica de juros do país de 38% para 45% ao ano, de uma tacada só – para efeitos de comparação, hoje a Selic está em 10,5% ao ano. O país passou a adotar o regime de metas de inflação como principal mecanismo para a estabilidade dos preços.

 

Arminio avalia que o Brasil só terá uma “taxa de juros normal” se houver uma política fiscal responsável o que não que não vê no atual governo. Ele apoiou publicamente o arcabouço fiscal apresentado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mas diz que, depois disso, o lado fiscal ficou “completamente fragilizado e encarado como se fosse uma maldade”.

 

Leia abaixo a íntegra da entrevista do economista. E veja, neste vídeo curto, a visão de Arminio Fraga sobre e legado do Plano Real e o que ainda precisa ser feito para a estabilidade da economia brasileira.

 

O senhor assumiu o Banco Central quando o dólar estava no pico, em março de 1999. Como foi administrar aquela crise?

 

Foi tenso. Quando o câmbio surtou (passou de R$ 1,20 antes de ser adotado o câmbio flutuante, para R$ 2,147 em março de 1999), o que eu tinha na cabeça era a experiência do México, que tinha acontecido exatamente quatro anos antes. E lá, a inflação chegou a bater, em 12 meses, 50%. O que a gente tinha na cabeça naquele momento era que, se chegar a 50%, vai indexar tudo e acabou o plano. A gente vai estar de volta à estaca zero ou até pior.

 

Para nós estava muito claro que tínhamos que dar um jeito de não deixar a inflação subir jogando limpo, sem tabelamento, sem congelamentos, sem nada.

 

Estávamos saindo de uma situação no qual o câmbio estava congelado, tinha um papel de âncora. Foi difícil sair (do câmbio fixo) com uma crise atrás da outra (foi uma década marcada por crises cambiais como a do México, em 1994, a asiática em 1997 e da Rússia, em 1998). Tivemos que ancorar a inflação assim à solta, sem truque, sem nada.

 

Foi um esforço muito grande, primeiro para explicar para as pessoas que o sistema tinha mudado, que o câmbio era flutuante, que a política monetária, portanto, ia ter um outro dono, o dono da política monetária ia ser a inflação. Ajudando tinha o ajuste fiscal que finalmente aconteceu, mas tinha ainda mais um reforço que veio da área externa, que era fazer a opinião internacional ver que o Brasil é um país conectado com o mundo. Os credores naquele momento eram os bancos.

 

Como isso foi feito?

Foi um trabalho todo feito para mostrar ao sistema bancário global que a nossa situação era bastante administrável, embora naquele momento não parecesse. Agora o câmbio cuida do balanço de pagamentos e o Banco Central cuida da inflação. Além de falar como é que a coisa funcionaria, dando uns sinais.

 

O primeiro sinal que nós demos foi: olha, vamos anunciar que no último trimestre do ano nós queremos a inflação anualizada em um dígito (a inflação foi de 8,94% em 1999). Foi ideia do Pedro Malan (ministro da Fazenda) e serviu muito bem naquele momento. E aí depois nós anunciamos as metas para o final do ano e para os dois anos subsequentes. Mas foi, assim, apavorante.

 

É como um trapezista que está acostumado a trabalhar com a rede, um trapezista assim, meio fora de forma, toma cervejinha, sobe, cai, não tem problema, pega outra latinha. Não tinha rede. Eu diria que ali, na medida em que o real se descolou completamente de uma moeda estrangeira, talvez fosse um passo final, num processo incrível que foi não só a URV (Unidade Real do Valor, que antecedeu o real) mas todas as crises que vieram depois e que foram sendo administradas.

 

Seu nome enfrentou resistência quando foi indicado. Como foi lidar com isso?

 

Difícil. Tinha alguma resistência natural, porque eu vim de Nova York, estava trabalhando com George Soros, um grande investidor internacional, especulador. Tinha também, talvez, até mais uma resistência política já sinalizando que o apoio ao presidente (Fernando Henrique Cardoso) naquele momento estava meio sub judice, porque estava com cara de que a economia ia descarrilhar.

 

De fato, se você olhar as notícias da época, claramente havia uma situação em que os aliados políticos estavam meio que desembarcando. Tinha o PMDB, PFL ali e pessoas individualmente, não me lembro dos detalhes, mas foi um pouco esse o pano de fundo.

 

Eu, por sorte, já tinha sido diretor do Banco Central, tinha passado por uma sabatina, eu fazia parte do grupo da PUC, eu tinha feito um doutorado nessa área e eu entendia bastante do tema. Crise era um pouco a especialidade da casa lá no Soros, então foi uma resistência, eu acho, mais política.

 

Não creio que tenha sido pessoal em momento algum, embora a minha família, em vários momentos, tenha ficado bastante chateada. Teve um episódio que meu filho viveu de um aluno mais velho falar mal de mim, então foi duro no início, mas eu não encarei aquilo como uma resistência pessoal.

 

O sistema de metas é sustentado pela confiança do mercado. Como foi estabelecer essa relação com o mercado financeiro e os outros agentes econômicos?

 

Eu acho que a principal ferramenta foi não complicar muito as coisas. Olha, esse é um sistema bem simples. O Banco Central tem as suas ferramentas, taxa de juros, sobretudo, e o Banco Central vai usar o seu instrumento através dos mecanismos habituais. Ali a gente teve que explicar bastante mais, mas era um conceito relativamente fácil. Vamos fazer o que for necessário para segurar a inflação.

 

Para isso, nós contamos com o apoio fiscal e, em função desse foco na inflação, o câmbio vai flutuar e ponto. Foi isso. O que o sistema trouxe, não foi invenção nossa, foram mecanismos de prestação de contas. Isso ocorria em primeiro lugar. Nas atas das reuniões tinha um pequeno comunicado, nós procuramos fazer atas escritas em português para as pessoas entenderem, não muito longas, não muito rebuscadas, oferecendo a nossa avaliação da situação, atas bem completas e tinha depois um relatório trimestral.

 

E é isso. Nós, dentro do Banco Central, tínhamos o entendimento de que quem falava sobre política monetária era eu como presidente, e os diretores tinham muita autonomia para falar sobre as áreas deles.

 

Fernando Figueiredo (diretor de Política Monetária) falava sobre sistema de pagamentos, algum tema mais técnico da mesa de mercado aberto, da mesa de câmbio, gestão de reservas exteriores, cada um na sua área. Isso também eu acho que facilitou um pouco. Não tinha muita confusão. Tem que lembrar o período em que o Alan Greenspan (presidente do Federal Reserve, o banco central americano, entre 1987 e 2006) andava sobre as águas.

 

Ele realmente foi uma pessoa brilhante e ele quase que hipnotizava, inclusive os outros presidentes de banco central, quando a gente se encontrava. A gente se encontrava dez vezes por ano, quando ele falava parecia um oráculo falando. Eu dizia na época que esse sistema era muito bom, porque ele não depende de um Alan Greenspan. E eu digo o mesmo até hoje.

 

Basicamente, quando a inflação está subindo, está acima da meta, o Banco Central aperta, se ela estiver abaixo da meta caindo, o Banco Central afrouxa e tem algum espaço para também ter de levar em conta o ciclo econômico, o tipo de problema que tem que ser enfrentado. Teve um período, assim, de educação, na verdade, de nós mesmos também, porque aquilo tudo era uma novidade. Mas o foco básico na inflação era quase que suficiente.

 

Mas os juros tiveram que subir muito (45% ao ano).

 

Naquele momento, as expectativas de inflação estavam indo para 50%. Aonde a gente ia pôr o juro? Foi um dilema tremendo. Nós fizemos um estudo que foi encomendado pelo Sérgio Werlang, que estava na área de pesquisa do banco (era diretor de Política Econômica), ao lado do Ilan Goldfajn (que viraria depois presidente do Banco Central entre 2016 e 2019, no governo do presidente Michel Temer), que estava na PUC, e eles fizeram juntos, para justamente tentar entender um pouco mais sobre o repasse inflacionário da depreciação cambial.

 

Isso não dava para fazer com estatística no Brasil, porque o câmbio estava fixo ou estava bem administrado. Estatisticamente você não tinha o que estimar. Aí foi feito um estudo com um painel enorme de países. Fizemos o melhor que nós podíamos naquele momento. Mas esse foi um ponto super importante do porquê de escolher exatamente aquele aumento enorme da taxa de juros.

 

Foi muito interessante porque no dia seguinte a inclinação da curva de juros virou, e as taxas mais longas caíram. Agora há pouco aconteceu o oposto. Teve aqui vários discursos de autoridades importantes que atrapalharam, eu diria até bastante, sobre o fiscal, sobre a própria política monetária. E a curva (de juros) empinou. Lá aconteceu o oposto, e isso nos deu bastante tranquilidade para prosseguir.

 

Mas com juros de 45% ficou mais fácil.

 

Eu sei. A gente até inventou aquela história na época de dizer quer se for necessário, a gente pode cortar. E depois a gente foi cortando, não demorou muito. A gente começou a cortar a taxa de juros real estimada em 20%, porque a inflação estava em 2%. A taxa caiu para metade rapidamente. Depois demorou a cair. Demorou mais do que pelo menos eu imaginava.

 

Os nossos juros ainda são muito altos.

 

Esse assunto é um assunto difícil de fato. Volta e meia ele aparece, e é compreensível uma certa frustração. Eu acredito que sem uma política fiscal responsável, o Brasil não vai conseguir ter um juro normal. Mas nós vimos quando o teto (de gastos, política fiscal que impedia aumento real das despesas públicas que vigorou de 2016 a 2023, sendo substituído pelo arcabouço fiscal que permite alta real do gasto de até 2,5%) ainda preservava alguma credibilidade. Aqui, o juro longo caiu abaixo de quatro. À medida que o teto foi meio que ficando furado, o juro voltou para cima.

 

Teve algum momento em que sentiu que poderia perder o controle do real e a inflação disparar novamente?

 

Tiveram dois momentos. Eu acho que o primeiro foi logo na largada, a gente podia queimar a largada. Tanto que, na hora de decidir onde é que nós íamos morar, a minha família estava nos Estados Unidos, nós queríamos fincar raízes no Rio em vez de ir para Brasília. Decidimos: Vamos logo para o Rio. Não sei quanto tempo que vai durar. Durou.

 

No final foi mais difícil, porque foi uma crise de confiança, no final de 2002, na transição para o governo Lula(no período eleitoral de 2022, o Brasil teve que recorrer a um socorro do FMI em meio a uma crise de confiança dos mercados). Porque, na medida em que ficou claro que o Serra (José Serra, candidato do PSDB à Presidência da República), que era o candidato da situação com responsabilidade fiscal, rateou nas pesquisas, o clima financeiro esquentou muito.

 

Ali foi mais difícil, porque, por mais que nós tivéssemos construído bastante credibilidade ao longo desse período todo, nós, em 1º de janeiro, não estaríamos mais lá.

 

Todo o mercado, mas vai além do mercado financeiro, a economia como um todo travou naquele momento porque parecia que um conjunto de políticas muito heterodoxas seria posto em prática. E o resultado era bem previsível. Estava no programa, no caso especificamente do PT, muito claro que o franco favorito era de fato o Lula e as ideias eram ultra heterodoxas. Falava-se muito em controle de câmbio.

 

Você começa a falar de controle de câmbio, o dinheiro vai embora fácil. “Opa, vem controle, aí eu vou cair fora”. Aquilo jogou o câmbio lá na Lua e nós tivemos que fazer um trabalho, eu diria um pouco diferente do trabalho típico de um banco central, porque foi um trabalho das internas de ajudar a convencer as pessoas de que o Brasil não precisava estar em crise, que os fundamentos estavam razoavelmente no lugar e que as coisas estavam indo bem e que essa crise de confiança poderia ser superada com políticas razoáveis de bom senso.

 

O próprio Lula começou a falar, foi quando o Palocci (Antonio Palocci, primeiro ministro da Fazenda de 2003 a 2006) entrou em cena. Quando as pessoas começaram a ver mais de perto os pronunciamentos dos atores principais, sobretudo do candidato Lula, mas do próprio Palocci, agindo com muita habilidade, acalmando as pessoas, dizendo: “não vai acontecer nada disso. Pode ficar tranquilo”. Ele foi nomeado o coordenador da transição e o balão foi esvaziando.

 

Essa parte foi muito tensa, porque houve um momento em que o Tesouro não conseguia vender papéis que vencessem no ano seguinte. Estava todo mundo encurtando (prazo do título público) para poder sair fora logo. E isso gerava imensa tensão. Nós fomos tomando todas as providências possíveis, inclusive oferecendo hedge (proteção cambial) ao mercado, vendendo papéis indexados, fazendo alguma intervenção no câmbio para tentar evitar movimentos mais exagerados, sobretudo quando o mercado ficava sem liquidez, que aí é um perigo.

 

O mercado sem liquidez pode fazer qualquer coisa, e nós tomamos todas as providências para ganhar tempo para o governo seguinte ter alguma chance. Se eles tivessem entrado e feito o que disseram a vida inteira que iam fazer, nós íamos levar culpa injustamente, porque nós trabalhamos para eles. Na verdade, montamos todo um conjunto de acordos com o FMI (Fundo Monetário Internacional), com bastante dinheiro à disposição (US$ 24 bilhões de um acordo com Fundo de US$ 30 bilhões).

 

Foi bem tenso, bem tenso. Interessante, mesmo tudo dando certo, o PT, assim que assumiu, começou a tentar destruir o que nós fizemos. Falando de herança maldita. Imagina se eles tivessem feito um monte de bobagens, não tivesse seguido, de certa forma, o que nos parecia razoável e com as pessoas que nós inclusive sugerimos. Imagina se tivesse dado errado, aí ia ser muito pior. Se já foi ruim na transição, então ia ser uma guerra. O jogo é pesado, mas enfim, deu certo.

 

O sistema de metas de inflação está fazendo agora 25 anos. As eleições não têm mais esse efeito de fazer o câmbio disparar?

 

Eu não tenho a menor dúvida que o sistema deu certo. Ele deu certo porque a principal âncora dele é social. Acho que o povo não ia gostar de inflação, mas a nossa história, a história de vários países, está repleta de governos que ignoraram esse tipo de risco político e fizeram besteira. E a coisa deu errado. Hoje o Brasil está com uma situação fiscal muito frágil, bastante dívida, tem muita pressão em cima do Banco Central.

 

O carro é bom, mas o motorista ainda pode dar de cara com o poste. Não existe sistema totalmente blindado. O sistema tem bastante flexibilidade, ele permite aguentar alguns trancos, mas ele não aguenta qualquer coisa não.

 

O que mostra nossa situação fiscal frágil?

 

Estamos com um déficit primário já há bastante tempo. Desde o colapso da Dilma (Rousseff, presidente entre 2011 e 2016, que sofreu impeachment), ele teve alguns momentos onde ele diminuiu, houve uma contenção enorme de gastos, congelamento de salários no governo anterior, mas no geral a situação fiscal já vem ruim há bastante tempo.

 

A dívida caiu como proporção do PIB durante um período, porque a inflação subiu muito e o juro estava baixo, porque a crise foi de fato muito, muito dura. E o Banco Central corretamente, afrouxou. Mas houve um período, num certo período de uns 18 meses, a taxa de juros real ficou muito baixa, ficou muito negativa e, além disso, as receitas advindas de um boom de commodities também ajudaram no fiscal.

 

Mas fora isso, a trajetória tem sido de alta. E o Brasil não é um país que tem o histórico de outros países, que têm mais dívida pública do que nós, e tem um juro muito mais alto.

 

Além disso, eu considero, mesmo nesses países que têm mais margem de manobra, que a política fiscal deles é totalmente irresponsável. De fora dos Estados Unidos, alguns países da Europa foi uma loucura, na minha opinião. E a conta vem, mas eles têm mais chance de administrar. Para nós é mais difícil.

 

Mesmo nos Estados Unidos, o mercado de títulos do Tesouro anda tendo um piripaque. Isso já aconteceu lá e aqui então, nem se fala. Então é uma ilusão total. Eu acho que o próprio presidente Lula outro dia desfilou os tamanhos das dívidas dos outros países, como se o Brasil pudesse, com juro real de mais do que 6% na ponta longa, resolver.

 

E ao mesmo tempo, também não adianta dizer que reduzir o juro vai resolver o problema fiscal. A gente já viu esse filme, não tem jeito se não tiver um fiscal responsável, um fiscal que alongue os horizontes, que dê um pouco de paz. Chega de crise.

 

O senhor acha o Banco Central precisa ser independente ou a autonomia já é suficiente?

 

A autonomia é o básico, essa parte é essencial. O resto da independência é um tema político extremamente delicado, com independência orçamentária para pagar salário. É um tema que acho que tem que ser discutido num contexto maior de exatamente a quem o BC vai prestar contas e como é que os funcionários públicos, nas várias áreas, vão ser avaliados, remunerados.

 

Essa é uma área bem complicada e tem sido objeto de alguma discussão. Um sobe (salário), o outro sobe. Essa área toda precisa ser repensada. O principal que é ter mandato e ter meta, ter uma meta clara está lá, mas tirar o Banco Central de uma discussão maior das carreiras em geral… Enfim, é tentador. Eu sou um enorme admirador do Banco Central, mas eu não faria, não colocaria.

 

No real, o que faltou fazer, a questão fiscal?

 

Não conseguimos resolver nem de perto. Tivemos uma excelente tentativa com a Lei de Responsabilidade Fiscal, que deu certo durante um bom tempo. Depois ela foi meio que destruída ali naquele período da Dilma e depois veio o teto, foi uma outra ideia, uma lei um pouco diferente, porque no fundo o teto é uma discussão sobre o tamanho do Estado, que, eu acho, precisa ser encarada de outra forma. Mas foi um período que trouxe algum resultado. Também já deixou de funcionar e nós estamos aí buscando uma resposta, mas está difícil. No momento está difícil.

 

O arcabouço fiscal não é uma solução?

 

Eu apoiei publicamente o arcabouço num primeiro momento, porque parecia, àquela altura, que o presidente da República queria ir na direção contrária. É quase como se ele fosse implantar um anti-arcabouço. Voltar para aquela ideia de que gasto é vida. Aí aparece o arcabouço, vamos ter aqui uma meta, vai ser uma meta modesta, mas que caminharia na direção de ter um superávit primário, ainda que pequeno e ainda que distante, porque era para o último ano do governo.

 

Eu achei que foi um primeiro passo bom, mas foi só um primeiro passo. E depois, como a gente tem visto, o lado fiscal segue extremamente fragilizado e encarado como se fosse uma maldade.

 

Quando na verdade, se a gente olhar com uma certa profundidade, como sempre quem se ferra é o pobre. Essa ideia de que a responsabilidade fiscal é uma maldade não é. O que falta é prioridade. O que falta é encarar para valer os problemas em três grandes blocos que no momento permanecem intocados: a Previdência, a folha de pagamentos do setor público como um todo, incluindo estados e municípios, e esse mundo de subsídios e vantagens que também não fazem o menor sentido econômico.

 

São filhos de interesses menores, são filhos de um Brasil que ainda tem um Estado muito capturado por esses interesses. Você fica tentando fazer uma coisinha aqui, uma coisinha ali. Não tem jeito, se o Brasil não encarar os problemas relevantes, ficar tentando uma solução aqui e outra ali, não vai adiantar. Vai ter que tocar nesses pontos nevrálgicos.