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Em “Moby Dick – The Whale”, clássica obra da literatura americana publicada em 1851, o autor Herman Melville narra a história do grupo de marinheiros que embarca no navio baleeiro Pequod, a fim de extrair do animal o óleo usado na iluminação de casas e ruas. Mas, para satisfazer a um desejo pessoal de vingança, o capitão Ahab impõe uma mudança de rota, e parte em caça da baleia que lhe havia amputado uma das pernas em expedição anterior. Na perseguição insana a Moby Dick, Ahab põe todos a bordo em risco e conduz a viagem a um desfecho trágico.
Muitas interpretações de ordem filosófica, histórica, política e mitológica já foram feitas sobre o enredo deste que é considerado um dos maiores romances dos Estados Unidos. Mas existe ainda uma analogia clara com os atuais tempos de emergência climática: decisões errôneas, motivadas por visões limitadas, são capazes de colocar tudo a perder. Em se tratando de clima, a sociedade global está no mesmo barco, e depende de um pacto cooperativo para não sucumbir às forças da natureza em um mar tormentoso.
Para lidar com a realidade alarmante do clima, a humanidade não pode mais se dar ao luxo de prescindir de instrumentos poderosos, entre eles a restauração de florestas. Não basta resolver a questão energética e zerar o desmatamento: esforços adicionais devem ser feitos, o quanto antes, para regenerar os ecossistemas que funcionam como importante sorvedouro de carbono – sem falar nos ganhos para biodiversidade, ciclo hídrico e preservação do solo, entre outros serviços ambientais.
Naturalmente, existem dúvidas no ambiente institucional sobre como desenvolver o instrumento da restauração, mas justamente por isso os esforços devem ser direcionados a aprimorá-lo, consolidando-o como uma classe de ativos financeiros no emergente mercado de carbono – seja oficial, seja voluntário. Há que se chegar a um acordo sobre pelo menos dois pontos controversos. Um deles versa sobre como comprovar a adicionalidade, ou seja, garantir que o aumento do sequestro de carbono em determinada área deveu-se à sua restauração florestal.
Outro ponto questionado é que a compensação (offset) do carbono por meio da restauração poderia ser usada pelas empresas emissoras para manterem seu business as usual – por exemplo, uma companhia de aviação que invista na restauração de florestas sem promover reduções efetivas nas emissões do combustível que utiliza. Nesse caso, há saídas que podem ser pactuadas, como estabelecer um teto para uso da compensação, definindo limites.
A boa notícia é que a agenda da restauração avança, e não só em países tropicais. Uma série de anúncios do departamento do Tesouro Americano neste ano mostra a intenção de investir na restauração nos próprios EUA, a exemplo do American Climate Corps, serviço do governo que colocará mais de 20 mil jovens para trabalhar em projetos relacionados ao clima, incluindo restauração florestal; e a proposta de alterar todos os 128 planos de gestão de terras florestais para melhor administrar florestas antigas em todo o Sistema Florestal Nacional. O Tesouro também firmou acordos com países amazônicos para redirecionar os pagamentos da dívida para esforços de conservação, protegendo mais de 68 milhões de acres de florestas tropicais, enquanto uma parceria com o Brasil visa aprimorar a arquitetura de financiamento climático, com foco na conservação de florestas e biodiversidade. Além disso, o Reino Unido comprometeu £ 1,5 bilhão para a proteção e restauração de florestas internacionais.
É visível a demanda para compensação de carbono por parte das empresas americanas de tecnologia, considerando o consumo altíssimo de energia da Inteligência Artificial. Pois uma árvore já reúne inteligência para sequestrar carbono desde já, fazendo do reflorestamento uma solução prática que está à mão. O reflorestamento deve ser uma prioridade mesmo que em 15 anos surjam alternativas mais competitivas e acessíveis.
Há, portanto, apetite para tornar a restauração florestal uma classe de ativos, jogando o mercado a favor da proteção climática. No Brasil, líder mundial em florestas tropicais, há um leque de oportunidades, com várias opções tecnológicas e faixas de custos, que se encaixam em diferentes interesses de investimento. O país que receberá a COP 30 do Clima abriga um robusto segmento empresarial, com representantes presentes na Climate Week em Nova York, prontos para debater e desenvolver o ambiente regulatório da restauração.
Os ruídos que ainda travam essa agenda são capazes de pôr a pique o Pequod, sugestivo nome de uma população indígena da América do Norte exterminada com a colonização europeia. Quase 200 anos depois, a humanidade já teve a oportunidade de reconhecer a importância de traçar um horizonte em comum e seguir a rota da descarbonização.
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