Casa das Garças

BC precisa de ajuda da política fiscal para domar a inflação, diz Arminio Fraga

Data: 

24/10/2024

Autor: 

Arminio Fraga

Veículo: 

Valor

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Para sócio da Gávea, seria preciso um ‘reforço’ para uma redução dos juros reais longos, que estão acima de 6,5%

O futuro presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, tem “os incentivos corretos para fazer uma política monetária razoável”. É o que avalia o sócio-fundador da Gávea Investimentos e ex-presidente do BC, Arminio Fraga, para quem “o mercado vai explodir e a inflação, possivelmente, também vai subir” caso a política monetária seja conduzida de forma “exótica” pela futura diretoria da autarquia.

 

Com um BC “muito bem estruturado”, os problemas recaem sobre os rumos da política fiscal, disse. “Se tem sido necessária uma taxa de juros tão alta para segurar a inflação, é porque o BC precisa de ajuda.”

 

Na visão de Arminio, a ajuda, nesse caso, teria de vir do lado da condução da política fiscal. “É o Tesouro segurar a barra um pouco. Isso exige, na minha opinião, uma abordagem muito mais profunda, muito mais estrutural para, de fato, ter impacto e jogar o juro lá para baixo, além de deixar a economia crescer sem medo de inflação”, aponta o economista.

 

Para ele, Galípolo é “inteligente, articulado” e pode ser bom ele ter sido “um cara da ‘cozinha da área da política’ porque ele vai dar um recado para essa turma” e dizer que precisa de mais ajuda.

 

“E ele depende do Congresso também. Não é só o Executivo. O Congresso também não está contribuindo para uma política fiscal mais robusta”, disse Arminio durante aula no curso Valor de jornalismo econômico. Este é o segundo ano consecutivo que ele participa do projeto.

 

Ao avaliar a política fiscal, inclusive, ele diz não sentir um grande apoio ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad e enfatiza que “os números não fecham” em relação às metas de resultado primário. “Temos de ser realistas. O Brasil deveria estar reduzindo a relação dívida/PIB para ter a chance de agir de novo se houver necessidade”, diz Arminio, ao se referir a momentos excepcionais, como a pandemia.

 

A implementação do arcabouço fiscal, nesse sentido, é vista por Arminio como uma decisão “corajosa” de Haddad. “Todo mundo era contra; o próprio presidente claramente era contra e tinha discursos raivosos até”, observa. Apesar disso, ele indica ter havido um erro na estratégia do governo em relação à condução dos gastos. “Aqui o governo entrou gastando. É Maquiavel básico: no início de mandato, você tem de arrumar a casa para, depois, colher os frutos.”

 

Nesse sentido, para Arminio, alcançar um superávit primário no último ano do governo pode ser uma tarefa complicada. “O último ano do governo é sempre complicado, está lá na frente e isso tira um pouco a credibilidade da proposta. Se o Brasil conseguir chegar a um superávit, sobretudo se for feito olhando os gastos recorrentes, fazendo uma coisa mais estrutural, acho que seria um avanço. Ainda seria arriscado, mas bem menos arriscado do que não fazer nada.”

 

E com um déficit primário de cerca de 1% do PIB neste ano e juros reais de mercado, extraídos das NTN-Bs (títulos indexados à inflação), negociados acima de 6,5% ao longo de toda a curva, a situação fiscal se torna “uma bola de neve monumental”, disse. “Não tenho dúvida que a recomendação seria um reforço fiscal. O ‘mix’ [de política econômica] está se mostrando complicado”, diz Arminio, ao avaliar, adicionalmente, que o ciclo de aperto monetário efetuado pelo BC “não é uma maldade, mas se deve a uma situação que precisa ser corrigida”.

 

“O que fazer, exatamente, é sempre uma combinação de políticas de curto e de longo prazo; as reformas de longo prazo na área fiscal têm muito impacto, mesmo que o efeito seja gradual, como no caso da Previdência, até para evitar uma piora maior. Isso precisa ser feito”, defende ele, para quem as discussões que o mercado tem tido sobre dominância fiscal, quando a política monetária perde efeito por conta do elevado nível da dívida pública, não se aplicam no momento.

 

Também não se aplica a visão de uma mudança no nível da meta de inflação, na visão de Arminio, que defende o nível de 3%. “Não vejo razão para mexer no nível e acho que o mercado se ajustaria”, afirma ao lembrar ainda que a inflação já está “bem acima” do centro da meta perseguida pelo BC.

 

O executivo inclusive enfatiza que o BC sempre agiu como se a meta fosse contínua. “Se você tem um choque de inflação em outubro, ninguém pode achar que o BC vai corrigir isso em dois meses… Chegamos onde queríamos chegar e esse é o grande avanço.”

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