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pedro.paulo

Doutor em Economia pelo Massachusetts Institute Of Technology e Graduado em Economia pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor do Departamento de Economia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. É economista-chefe do Banco Genial. É referência em estudos e propostas sobre relações do trabalho e inclusão.


Resumo:

O economista e professor da PUC-Rio José Márcio Camargo traz ao podcast A Arte da Política Econômica a importância dos incentivos no desenho de políticas no mercado de trabalho e a demonstração da força das ideias como ação propulsora de políticas públicas. Camargo teve uma breve passagem no governo e contribuiu para o desenho de políticas, a exemplo do programa de transferência de renda, conhecido hoje por bolsa família.  Camargo participou também das discussões da reforma trabalhista, aprovada em 2017. 

Anos 80: política salarial, inflação e a exploração do papel dos incentivos 

Com a conclusão do doutorado no MIT e com tese sobre a formação do mercado de trabalho em São Paulo, José Marcio Camargo retorna ao Brasil e dedica suas pesquisas aos temas do mercado de trabalho. Nos anos 1980, seu foco foi o exame dos efeitos da política salarial sobre a formação de salários e preços na economia brasileira. Nesse período, marcado por inflação alta, a compreensão dos efeitos da política salarial assumia uma maior importância em relação a outros aspectos do funcionamento do mercado de trabalho. Ainda nessa época, inspirado por breve experiência no governo e por aspectos de relações do trabalho que teve oportunidade de observar, passa a explorar, com mais intensidade, a avaliação dos efeitos dos incentivos das regras institucionais sobre o funcionamento do mercado de trabalho. 

O novo ambiente político e o papel das ideias

Com a democracia, floresce o espaço para a promoção de propostas. De início, em meados dos anos 1980, o debate acadêmico é amplificado através de artigos publicados nos jornais, em temas como mercado de trabalho, pobreza e desigualdade. Na linha de frente, estava presente não apenas José Márcio, mas também um grupo de economistas que estudava esses temas na PUC-Rio e no Ipea. Dois tópicos ilustram o papel dos incentivos. O primeiro, a observação da grande rotatividade de trabalhadores e sua causa, que era o incentivo gerado pela natureza da bonificação ao trabalhador, caso fosse demitido. O segundo foi a constatação da importância do auxílio financeiro às famílias com filhos matriculados no sistema escolar de ensino público. Famílias com baixa renda per capita podiam optar pela não educação escolar de seus filhos para que esses contribuíssem na renda de casa. Nomeado de Bolsa-Escola, o programa de transferência de renda sugerido recebeu apoio político mais tarde e foi implementado pelo ministro da educação Paulo Renato em 2001. Posteriormente, no Governo Lula, é modificado, ampliado e recebe o nome de Bolsa Família.

O caminho e condições para as reformas trabalhistas 

No caminho da reforma trabalhista de 2017, ocorreram peças fundamentais. A primeira se deu pela evolução do governo do Partido dos Trabalhadores, que se volta inicialmente para a resolução de reformas importantes e dá atenção ao equilíbrio fiscal. Essa trajetória é interrompida a partir de 2006 quando se abandona a necessidade de equilíbrio fiscal, há o agravamento da crise econômica e condições que conduzem ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff em 2014. A partir daí, entra em cena o vice-presidente Michel Temer, pelo PMDB (hoje MDB), que trouxe um projeto de reformas fechado – inspirado no documento Ponte para o Futuro – que começou com o teto de gastos¹, em seguida da reforma trabalhista² e a terceirização de atividades³, dentre outras. Na reforma trabalhista houve o fim do imposto destinado aos sindicatos, o que reduziu em grande escala o poder dessas corporações. Houve também o aumento da flexibilidade nos contratos de relações de trabalho. Por fim, pode ser destacada a redução no custo de se demitir um empregado, que veio na direção de não se gerarem incentivos para o trabalhador optar pela demissão, já que o empregado passa a arcar com os custos no tribunal em caso de derrota para o empregador. 

As balizas das reformas e a superação das distorções

A Constituição, as leis ordinárias e a atuação dos diversos órgãos que fazem parte da institucionalidade do mercado de trabalho são balizas importantes, mas podem ser também a causa de importantes distorções nas oportunidades de trabalho. O Executivo dispõe de margem de manobra para a realização de políticas que diminuam tais efeitos, porém limitam-se a propostas que não firam o artigo sétimo da Constituição, sobre os direitos dos trabalhadores. Por exemplo, tem-se não só o pagamento do salário-mínimo presente na Constituição como também seu reajuste de acordo com a inflação, a fim de que se mantenha seu valor real. A lei pode gerar, em parte, um aumento da informalidade, isto é, a quantidade de trabalhadores no setor informal de trabalho tende a aumentar e também com uma elevação do desemprego. Isso se dá pela razão simples dos ganhos de produtividade em relação aos salários pagos, ou seja, só haverá contratação caso o custo do empregado seja menor do que os ganhos de produtividade que gera. Dada as restrições políticas é importante explorar propostas de reformas infraconstitucionais, como é o caso da reforma trabalhista e de ações desburocratizantes.  

Para a desigualdade, uma solução de longo prazo, para a pobreza, de curto prazo…

Independentemente do assunto, seja do funcionamento do mercado de trabalho, da desigualdade ou da pobreza, é fundamental o investimento na educação, base para o avanço da sociedade. Agora, mais do que nunca, a partir da inovação tecnológica já instaurada, mas acelerada com a pandemia, é reconhecida a vantagem daqueles que priorizam a educação. Esse processo se dá em razão do aumento dos incentivos para automatização, onde pessoas menos qualificadas terão menos oportunidades de trabalho, salários mais baixos e relações de trabalho mais deterioradas. Apesar da solução da desigualdade estar na educação, essa tem efeito insuficiente no curto prazo. Sabe-se que crianças com pais de maior capital humano acumulado, ou seja, com maior educação e qualificação, tendem a seguir também pelo mesmo caminho, o que aumenta suas chances de sucesso no futuro. Dessa forma, com o incentivo à educação, há um ciclo virtuoso, no qual se reduz a distância entre os mais pobres e aqueles de melhores condições. Esse processo é complexo, custoso e longo, e o que fica para o curto prazo é redução da pobreza, a qual pode ser feita, por exemplo, através de leis e projetos na área trabalhista.

Uma lição valiosa dentro do ambiente político 

Quando se está envolvido com Brasília, é fundamental ter, antes de tudo, objetivos e clareza de ideias. Sem transparência e simplicidade é difícil se chegar a algum lugar dentro ou a serviço da política. É preciso, também, sobretudo em sociedades democráticas, a capacidade de negociação, já que ela permeia o ambiente político. Não se pode esperar ter a melhor opção sempre; se quiser resultados, o que se pode fazer, na verdade, é buscar o melhor para as partes envolvidas no processo. Um caso conhecido que unia esses pontos foi a hierarquia utilizada por Michel Temer na aprovação de propostas mais importantes como o teto de gastos e através de projetos de lei de menor complexidade, como a reforma das estatais e do ensino médio. A boa ação política será aquela que tiver clareza nas propostas e poder de negociação e barganha. 

¹disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/127337

²disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13467.htm

³disponível em: https://www.conjur.com.br/dl/lei-terceirizacao.pdf


Leituras sugeridas:

CAMARGO, José Márcio. Flexibilidade do Mercado de Trabalho no Brasil. FGV, 1996

– CAMARGO, J.M ; ALMEIDA, H. Human Capital Investment and Poverty. Departamento de Economia PUC-Rio, 1994. 

Texto disponível em: http://www.econ.puc-rio.br/uploads/adm/trabalhos/files/td319.pdf

– CAMARGO, J.M ; FERREIRA, F. O Benefício Social Único: uma proposta de reforma da política social no Brasil. Departamento de Economia PUC-Rio, 2001. 

Texto disponível em: http://www.econ.puc-rio.br/uploads/adm/trabalhos/files/td443.pdf

– CAMARGO,  José  Márcio.  Os  Miseráveis.  Folha  de  São  Paulo, São Paulo 03 mar. 1993.

– CAMARGO,  José  Márcio.  Os  Miseráveis 2.  Folha  de  São  Paulo, São Paulo 12 ago. 1993.

Texto disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/1995/8/12/opiniao/11.html

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