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pedro.paulo

Murilo Portugal é bacharel em Direito pela Universidade Federal Fluminense, tem diploma em Desenvolvimento Econômico pela Universidade de Cambridge e é mestre em Economia pela Universidade de Manchester, Inglaterra.
Foi assessor na Casa Civil, de 1980 a 1985, e Chefe da Assessoria Econômica da Secretaria Geral da Presidência da República entre 1990 e 1992. Foi Secretário do Tesouro Nacional de 1992 a 1996, e participou da implementação do Plano Real.
No exterior, Murilo foi Diretor Executivo do Banco Mundial em 1996 e Diretor Executivo do Fundo Monetário Internacional de 1998 até 2005 .
Retornou ao Brasil, em 2005, para ocupar a secretaria executiva do Ministério da Fazenda, onde ficou até março de 2006. Em dezembro de 2006, Murilo voltou para o FMI no cargo de vice-diretor geral. Em março de 2011 deixou o posto no FMI para se tornar presidente da FEBRABAN – Federação Brasileira de Bancos até 2020.
Murilo também participou de diversos conselhos tais como Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Eletrobrás e IRB.


Resumo:

Murilo Portugal traz ao Podcast A Arte da Política Econômica relatos de experiências e lições extraídas da sua participação em organismos públicos brasileiros e internacionais. Ex-assessor da Casa Civil (1981-1985), secretário do Tesouro Nacional (1992-1996) e secretário-executivo do Ministério da Fazenda (2005-2006), Murilo detalha a importância do assessoramento e coordenação das ações de governo na Casa Civil e fatores relevantes na consolidação da Secretaria do Tesouro. Expõe, ainda, as condições que levaram ao maior superávit primário da história em 1994. Tendo ocupado direção executiva no Banco Mundial (1996-1998) e no FMI (1998-2005), relata o tenso ambiente de negociações em 1998 entre o Brasil e o Fundo. Por fim, como vice-diretor geral do FMI (2006-2011) liderou um portfólio de 81 países, e exibe o contexto e o papel do Fundo na crise financeira mundial de 2008. 

Desenhos institucionais e estruturação na Casa Civil  

Para se ter instituições fortes e eficientes, demandam-se processos e rotinas de trabalho bem definidos, estruturas bem desenhadas e servidores de alta qualidade moral e técnica. Na Casa Civil, a estrutura organizacional, se comparada a de outros órgãos administrativos, exige maior flexibilidade, já que deve se adaptar às prioridades e diferentes programas de cada governo. Assim, para a Presidência, uma recomendação seria a presença de consultores de alto nível, permanentes, nas áreas econômica, social, legal, política e internacional com capacidade de suporte e assessoramento, mesmo com alguma redundância em relação aos órgãos específicos. Desde o governo Collor, a estrutura da Presidência, na maior parte dos governos, mantém um desenho que também inclui as Secretarias Geral, de Assuntos Estratégicos e de Governo.

Consolidação da Secretaria do Tesouro Nacional (STN): gestão por metas

Entre 1992 e 1996, ocorre um importante processo de consolidação da Secretaria do Tesouro Nacional. Uma das primeiras medidas foi o desenho de um sistema remuneratório, baseado em ganhos por produtividade. O projeto enfrenta resistência, sobretudo da área administrativa do governo, da Casa Civil, e é implementado apenas ao final do mandato presidencial de Itamar Franco. A Gratificação de Desempenho e Produtividade (GDP) dependeria tanto do desempenho individual quanto do alcance de metas preestabelecidas para cada divisão do Tesouro. As metas eram estabelecidas para cada semestre e deveriam atender a três critérios básicos: ter relevância, ser observável e possuir o máximo de independência de condições externas.

1993-1994: avanços fiscais e o maior superávit primário da história

Em paralelo à consolidação da STN, ocorreram significativos avanços institucionais na área fiscal ainda em 1993, que precederam e conduziram à sustentação do Plano Real. Uma das medidas foi o refinanciamento das dívidas dos estados com a União. A proposta de rolagem da dívida, em contraste às anteriores, era baseada em garantias líquidas e de fácil execução, dadas pelos estados e municípios à União, condicionadas ao não pagamento do montante financiado. Ainda em 1993, foi aprovado o Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF). Logo após, em 1994, criou-se o Fundo Social de Emergência que desvinculou 20% da receita tributária da União.  Com essas medidas, mais a execução do Orçamento por duodécimos, foi possível alcançar, em 1994, o maior superávit primário da história, de 5,17% do PIB. 

Negociações com o FMI e a mudança cambial

Nas negociações do Brasil com o FMI em 1998, a parte mais difícil do acordo foi a relacionada à manutenção do regime de câmbio semifixo. O Fundo não cedia e houve uma busca de apoio junto ao governo dos EUA e países do G7; apesar de o Fundo ter aceito a posição brasileira, essa foi uma opção, percebida, a posteriori, como inadequada. Outro ponto decidido, na última semana de negociações, foi o montante total desejado de financiamento, que não seria divulgado de imediato¹. Pedro Malan tinha interesse em preservar o impacto do anúncio de um valor expressivo para influenciar as expectativas do mercado e nem mesmo seus negociadores tinham conhecimento do montante. O desenho do acordo não se sustenta por muito tempo. Com a fuga de capitais e a necessidade de se flutuar o câmbio, medida defendida, antes, pelo FMI, Malan exerce forte influência no Fundo para a manutenção do programa. Em fevereiro de 1999, Armínio Fraga assume a presidência do Banco Central e aumenta a taxa de juros a fim de conter a especulação cambial e a fuga de capitais, introduzindo também uma mudança no regime da política monetária. 

O FMI na crise mundial de 2008

Além da função básica de prestar auxílio financeiro aos países em crise e assistência técnica, o FMI é responsável por exercer vigilância econômico-financeira e aconselhamento aos países membros, a função de surveillance do FMI. Na prática, essa função tinha pouco impacto nos países; o Fundo também não avaliava, em detalhes, os riscos de crises financeiras em países de maior influência no cenário internacional. Com a crise, o FMI volta a financiar países desenvolvidos e retoma suas origens ao conceder empréstimos a países europeus, cerca de 94 bilhões de dólares. Houve ainda grande aumento dos empréstimos aos países em desenvolvimento. Em 2009, foi feita, pelo Fundo, uma emissão de 183 bilhões de SDRs², que representavam cerca de 260 bilhões de dólares. De modo similar, ocorreu o fortalecimento da regulação financeira aplicável aos bancos privados e da vigilância financeira global do Fundo. 

Roteiro para contenção de crises

Em primeiro lugar, é preciso haver boas políticas macroeconômicas para evitar que crises ocorram com frequência. É certo que haverá situações de maior imprevisibilidade, desencadeadas por fatores exógenos. Entretanto, para qualquer tipo de crise financeira, o custo para a solução é sempre muito concentrado em um período, e o custo se torna maior do que o da prevenção. Portanto, é preciso agir rápido e decisivamente, para que se possa surpreender positivamente os mercados e alterar as expectativas. 

Agendas inconclusas e lições para gestores públicos  

No Brasil, há uma importante uma agenda inconclusa econômica e social. É preciso, porém, que haja uma mudança cultural, que valorize a ética do trabalho, do esforço e das responsabilidades individuais, sem as quais torna-se árduo progredir. Para aqueles que almejam o serviço público, é importante ter como orientação o interesse público e se cercar de pessoas bem-preparadas tecnicamente que possuam essa mesma indicação. É também importante considerar as condições políticas existentes e trabalhar incansavelmente rumo às mudanças necessárias, com a consciência de que, muitas vezes, o alvo não estará no avanço, mas no impedimento do retrocesso. 

¹com o anúncio do programa, é exposto o montante de 41 bilhões de dólares. 

²criados em 1969, pelo FMI, os Special Drawing Rights, ou Direitos Especiais de Saque (DES), são ativos de reserva em moeda estrangeira definidos e mantidos pelo FMI. 


Leituras sugeridas:

KENNAN, George Frost. Around the Cragged Hill: A Personal and Political Philosophy. W. W. Norton & Company, 1994.

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Episódio 8