Procura
Procura
Hospedado por
pedro.paulo

GUSTAVO LOYOLA

Diretor-Presidente da Tendências, é Doutor em economia pela EPGE-FGV, foi Diretor de Normas do Mercado Financeiro e posteriormente Presidente do Banco Central, por duas vezes (1992-1993 e 1995-1997). Participa de conselhos de administração de diversas empresas. Foi escolhido “Economista do Ano” em 2014, pela Ordem dos Economistas do Brasil.

EDUARDO AUGUSTO GUIMARÃES

Consultor de empresas, Doutor em Economia pela University of London, foi economista do IPEA, Presidente do IBGE, Secretário do Tesouro Nacional do Ministério da Fazenda e Presidente do Banespa e Banco do Brasil.  Foi também Professor e Diretor do Instituto de Economia Industrial da UFRJ, bem como Professor do Departamento de Economia da PUC/RJ e da Faculdade de Economia e Administração da UFF


Resumo:

O IEPE/Casa das Garças recebe os economistas Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central (1992-1993 e 1995-1997), e Eduardo Augusto Guimarães, ex-Secretário do Tesouro Nacional (1996-1999). Eles discutem os desafios de adaptação do sistema bancário e dos tesouros estaduais ao fim do regime de alta inflação. Examinam os cenários fiscal e monetário nos programas de reestruturação e renegociação de dívidas dos estados. Por fim, buscam elucidar o papel dos programas de amparo de bancos privados, pelo PROER, e de bancos públicos, pelo PROES e o PROEF, reformas essenciais para o fortalecimento institucional do Banco Central e maior estabilidade da economia.

A dependência dos bancos ao float inflacionário 

O sistema financeiro se adaptou e desenvolveu mecanismos de convivência com o ambiente de alta inflação da década de 1980. Nesse período, mesmo sob elevada inflação não houve fuga da poupança doméstica para ativos em moeda estrangeira. A poupança foi mantida, basicamente, na moeda nacional, através da emissão de depósitos remunerados de elevada liquidez. Nesse período, o crédito no sistema bancário, sobretudo de longo prazo, apresentava baixa participação em relação ao PIB, se comparado com outros países. O sistema bancário brasileiro tinha uma importante fonte de financiamento por meio da arrecadação do imposto inflacionário, com aplicações de curto prazo. Dada a série de planos malsucedidos antes do Real, que concorreram para fragilizar o sistema financeiro, o inesperado êxito do Plano de 1994 forçou uma abrupta adaptação do sistema bancário, que perdeu parte de suas receitas decorrentes do float inflacionário, o que gerou um ambiente de instabilidade financeira. 

O fim da inflação e seus impactos nos tesouros estaduais

Nos tesouros estaduais, o controle inflacionário teve consequências de menor escala quando comparado ao sistema bancário. Contando com a inflação, os governos estaduais assumiam compromissos de gastos que se dissolviam no médio prazo e suas receitas tendiam a acompanhar a inflação. A existência desse mecanismo que viabilizava a administração de caixa dos tesouros estaduais criava um aparente controle do déficit público, mas não deixava de gerar efeitos adversos para a gestão pública. A incerteza, provocada pela instabilidade nos preços, desfavorecia a gestão dos orçamentos, com impactos negativos para a administração pública e a produtividade. Nesse ambiente, era comum se observar os fornecedores adotando reajustes preventivos de preços ante a perspectiva de atrasos de pagamentos e da alta da inflação. Era um cenário que gerava ineficiências e desorganização na gestão do Estado. 

Os caminhos para o processo de renegociação das dívidas estaduais em 1997

O endividamento excessivo dos Estados vinha desde a década de 1980, e se agravara com o passar dos anos. Ocorreram duas renegociações ineficazes junto à União, porém importantes do ponto de vista didático, em 1989 e 1993. Ficou claro, em primeiro lugar, a ineficiência do financiamento de apenas parcelas das dívidas dos Estados, já que as restantes continuariam a crescer. Ademais, não bastaria o financiamento sem atenção à capacidade de pagamento dos estados e controle de seus déficits. Por fim, era preciso considerar a natureza específica da crise fiscal de cada estado. Observadas essas características, foi adotado, no governo FHC, o refinanciamento vinculado a um programa de reestruturação e ajuste fiscal específico para cada unidade da federação, que contemplava a reforma estrutural do estado, sobretudo a patrimonial. A exemplo do FMI, condicionou-se o financiamento à implementação de programa de ajuste e reformas. 

Lei do realismo, indução de reformas estruturais e privatizações nos estados 

Uma das diretrizes do refinanciamento das dívidas estaduais foi a lei do realismo. Era preciso evitar que o custo da rolagem da dívida dos estados se revelasse insustentável. Duas questões eram relevantes: a primeira, a necessidade de uma taxa de juros de rolagem menor do que a praticada no mercado, já que as taxas praticadas na década de 1990 inviabilizavam a sustentação fiscal dos estados. A segunda, além de generoso prazo de 30 anos para pagamento, foi a imposição de um limite máximo, de 11% a 13%, para o comprometimento da receita líquida do estado no cumprimento das obrigações do refinanciamento. Houve, também, o aproveitamento do refinanciamento para uma indução à reforma estrutural das administrações estaduais. Havia previsão do pagamento prévio de 20% do valor do refinanciamento através da transferência de ativos dos estados para a União, o que impulsionou a privatização de empresas e bancos estaduais.

Os múltiplos emissores de moeda: o caso dos bancos públicos estaduais

No início dos anos 1990, além do BC, havia múltiplos bancos emissores de moeda no Brasil, federais e estaduais. O mecanismo de criação de moeda se dava pela dificuldade de financiamento dos bancos no mercado, os quais ficavam com reserva negativa no Banco Central, o que conduzia a emissões de moeda. A indisciplina dos bancos estaduais estava associada, em grande medida, ao financiamento dos tesouros estaduais, desde os financiamentos diretos que não eram pagos, às dívidas mobiliárias, em que os bancos davam liquidez aos títulos públicos emitidos pelo estado. Os bancos estaduais ficavam com dificuldade de se financiar no mercado e ficavam com reserva negativa no BC. Ou seja, para financiamento dos estados, os bancos estaduais financiavam-se no Banco Central. Outro problema associado à precariedade dos bancos estaduais era a pressão política sobre o Conselho Monetário, com a geração de regras excessivamente permissivas para o provisionamento de crédito.

Programas de reestruturação dos bancos públicos e construção institucional do Banco Central 

O programa de refinanciamento das dívidas estaduais buscou solução definitiva para o problema dos bancos estaduais via criação do PROES. O saneamento dos bancos pelo programa esteve associado ao compromisso com a privatização. Outro aspecto relevante foi a proibição de emissão de dívidas mobiliárias. Nesse sentido, o programa se mostrou bem-sucedido, já que houve significativa adesão às normas estabelecidas. Houve, também, através do PROEF, a reabilitação dos bancos públicos federais, como o Banco do Brasil e Caixa Econômica, além da privatização do Banco Meridional. Ainda no início dos anos 1980, houvera a criação da Secretaria do Tesouro e o fim da conta movimento entre o Banco do Brasil e o Banco Central. Nesse contexto, os programas de reestruturação dos bancos públicos foram fundamentais para a geração de um novo regime monetário e o fortalecimento institucional do Banco Central. 

Reestruturação do sistema bancário privado: o papel do PROER 

O objetivo principal do PROER (1995) era a prevenção de uma crise bancária sistêmica. O programa, com foco nos bancos privados, teve suas bases definidas e adaptadas a partir do modelo internacional de good bank/bad bank. Com isso, havia separação e acondicionamento de ativos de um banco para outro, e venda para instituições em melhores condições financeiras ou investidores interessados em entrar no mercado. A iniciativa ajudou na preservação dos direitos e haveres de depositantes, ao passo que não se premiavam acionistas dos bancos em crise falimentar. Desenvolveu-se, então, um mecanismo de financiamento dos bancos por meio de ativos contra o Tesouro Nacional, de longo prazo e com pouca liquidez, aceitos como garantia pelo BC, as denominadas moedas de privatização. Às ações estruturantes do PROER, acrescentem-se as mudanças regulatórias do sistema bancário brasileiro, as quais garantiram a adaptação ao novo regime de baixa inflação e o fortalecimento do sistema financeiro. 


Leituras sugeridas:

LOPREATO, Francisco Luiz. “O endividamento dos governos estaduais nos anos 90”. Texto para Discussão. IE/UNICAMP n. 94, mar. 2000
https://www.eco.unicamp.br/images/arquivos/artigos/1724/texto94.pdf
MENDES, Marcos. “Crise Fiscal Dos Estados: 40 anos de socorros financeiros e suas causas”. INSPER, 2020.
https://www.insper.edu.br/wp-content/uploads/2020/08/Crise-fiscal-dos-estados
MENDES, Marcos. “Mitos sobre o Federalismo Brasileiro”. Ináper, sertembro 2019
MORA, Mônica and GIAMBIAGI, Fabio. “Federalism and subnational debt: a discussion on the sustainability of state debt”. Rev. Econ. Polit. [online]. 2007, vol.27, n.3, pp.472-494.. https://doi.org/10.1590/S0101-31572007000300009.
RIGOLON, Francisco e GIAMBIAGI, Fabio. “A Renegociação das Dívidas e o Regime Fiscal dos Estados”. Texto para Discussão 69.
https://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/conhecimento/td/Td-69.pdf

Últimos episódios

Episódio 11